São Paulo, terça-feira, 08 de janeiro de 2008

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FERNANDO CANZIAN

Jogando contra quem paga a conta

A DERROTA do governo na votação da CPMF destampou a situação de precariedade das contas públicas do país e oferece uma idéia precisa do gigantismo do glutão Estado brasileiro. Para compensar os cerca de R$ 40 bilhões perdidos com o fim do imposto do cheque, o governo espera R$ 10 bilhões de uma elevação natural da arrecadação e outros R$ 10 bilhões em receitas geradas por novo aumento de impostos e contribuições. Os R$ 20 bilhões restantes sairiam de um corte de gastos em várias áreas.
Esses R$ 20 bilhões equivalem a apenas 3,5% de todas as despesas obrigatórias ou não previstas pelo governo. É pouco considerando verbas totais de mais de R$ 560 bilhões. Mesmo assim, o governo já está mudando de idéia quanto à tosa em face à rigidez orçamentária.
Na ponta do lápis, só 11% do gasto não-financeiro do governo central é hoje passível de corte.
O restante são despesas obrigatórias e crescentes, como o gasto com o funcionalismo (subiu 20% acima da inflação em dez anos) e outros vinculados à Previdência (alta superior a 25%). Ao longo dos próximos anos, com o novo inchaço na máquina patrocinado pelo governo Lula, essa margem para cortes vai diminuir ainda mais.
O mais grave é que a situação do governo só é confortável hoje porque a arrecadação está "bombando" junto com a economia. Uma reversão nesse quadro é a ante-sala de uma nova crise fiscal.
Diante do engessamento e do constante aumento da despesa pública, o governo está preferindo tomar, como sempre, o caminho mais fácil. Segundo o ministro Paulo Bernardo (Planejamento), a opção mais viável talvez seja diminuir a economia que o governo faz para pagar juros de sua dívida.
Lançando mão da prerrogativa do chamado PPI (Projeto Piloto de Investimentos Públicos), o governo deixaria de economizar em 2008 o equivalente a R$ 13,8 bilhões que seriam usados para pagar a dívida pública. O corte de R$ 20 bilhões, portanto, sairia pela bagatela de R$ 6,2 bilhões. "Genial" do ponto de vista matemático, a estratégia tende a diminuir a velocidade da queda da relação dívida/PIB (hoje em 42,6%) e emparedar ainda mais o Banco Central, já preocupado o bastante com a inflação, no que se refere a novos cortes de juros.
A decisão pelo mais fácil também contribui para adiar ainda mais a chegada do chamado grau de investimento ao Brasil. Sem ele, as empresas privadas continuarão pagando mais caro que suas concorrentes emergentes por financiamentos no exterior e contarão com menos investidores internacionais interessados em suas ações -outra forma de levantar dinheiro barato para investimentos e negócios.
De novo, é o governo trabalhando contra o Brasil que o sustenta.


FERNANDO CANZIAN é repórter especial da Folha.


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