São Paulo, sábado, 08 de janeiro de 2011 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES A redução de recursos torna a Justiça mais célere? NÃO Recursos são salvaguardas dos cidadãos LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO O litígio que o cidadão leva para a Justiça em busca de uma solução rápida acaba sempre concorrendo com outro problema inerente à máquina do Judiciário: a morosidade da Justiça, que agrega um sofrimento a mais para advogados, magistrados e promotores e para o jurisdicionado, que não tem celeridade no provimento jurisdicional. Mas atribuir ao número de recursos previstos em lei a lentidão processual constitui um equívoco. A Justiça dos homens é falível, como falível é o homem. O trabalho do advogado é garantir uma sentença justa e, para tanto, recorre de uma decisão que pretende seja reexaminada, num sistema que visa diminuir, o quanto possível, os erros. A defesa tem como missão resguardar o amplo direito de defesa e o contraditório da parte, agindo com independência e ética. E, caso não assegure ao seu cliente todos os recursos estabelecidos na legislação, da primeira à instância superior, não estará à altura da confiança que lhe foi depositada. Mas há, sim, um gargalo recursal do sistema processual brasileiro voltado a atender ao próprio Estado, suas autarquias e fundações, que dispõem de prazo em quádruplo para responder e de prazo em dobro para recorrer. Portanto, a lei prevê o emprego de recurso obrigatório para decisões contra o Estado, até porque não seria absurdo admitir que é do interesse do ente público adiar o pagamento de suas dívidas. Um exemplo irrefutável disso são os precatórios, sentenças judiciais transitadas em julgado, cujo pagamento não se cumpre, se protela. Portanto, a prática da excessiva interposição de recursos e de manobras protelatórias são comuns ao Estado. Por óbvio, a morosidade da Justiça atropela direitos e não tem uma causa única. A autonomia financeira do Judiciário, prevista na Constituição Federal, mas não viabilizada pelos Estados, está entre as causas mais visíveis. Em São Paulo, o maior tribunal do país, com 20 milhões de processos em tramitação, houve corte orçamentário. Portanto, faltarão recursos para instalar 200 varas já criadas, ampliar o número de magistrados, concluir a informatização, modernizar a gestão e fazer a reposição inflacionária no salário dos servidores. A somatória desses fatores terá reflexos negativos sobre a Justiça bandeirante durante a próxima década se nada for feito. A cultura do litígio também é outro obstáculo a ser vencido na busca pela celeridade judicial, inclusive entre os operadores do Direito. Ainda há muita resistência às formas alternativas de solução de conflito, como a mediação, a conciliação e a arbitragem, sendo que esta última, embora seja alvo de um diploma legal dos mais avançados, ficou estagnada por anos à espera da conclusão do debate sobre sua constitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. A eternização dos feitos judiciais não interessa a ninguém, sendo que a simplificação do rito processual e a duração razoável dos processos são metas almejadas por todos que militam no Direito. Por isso, nos preocupam as reformas em curso do Código de Processo Civil e do Código de Processo Penal. Sob a justificativa de reduzir o tempo de andamento dos processos, propõe-se nos dois textos a extinção de recursos que, em nosso entender, implicam a redução de salvaguardas aos direitos dos cidadãos. Em vez de se diminuir o número de recursos, dever-se-ia diminuir o tempo para julgá-los! LUIZ FLÁVIO BORGES D'URSO, advogado criminalista, mestre e doutor em direito penal pela USP, professor honoris causa da FMU, é presidente da OAB-SP (seccional paulista do Ordem dos Advogados do Brasil). Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: Cesar Maia: A oposição política Próximo Texto: Gabriel Wedy: Por uma Justiça sem escalas Índice | Comunicar Erros |
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