São Paulo, quarta-feira, 08 de março de 2006

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ANTONIO DELFIM NETTO

Abertura comercial e inflação

Uma pergunta simples, mas de resposta complexa: "Por que alguém se dispõe a exportar?". Por definição, nenhum agente individual precisa exportar. Ele se acomodará em seu "nicho" tentando maximizar o resultado de sua ação, que será condicionado pelo sistema de preços estabelecido internamente pelo nível existente de "proteção". O seguro é que tal economia será muito ineficiente.
Um dos poucos teoremas relevantes da teoria do comércio internacional é que se pode demonstrar, em condições muito gerais, que "algum comércio é sempre melhor do que nenhum comércio". Quando um país abdica de suas "vantagens comparativas", ele está comprometendo a sua produtividade e cultivando a pobreza. Estamos, pois, diante de um caso da famosa falácia da composição: o que vale para cada um dos agentes não vale para todos, ou seja, para a nação.
É a nação, isto é, o conjunto de todos os agentes, que necessita da exportação. Por quê? Simplesmente porque a exportação é a moeda de troca no grande "supermercado" mundial de bens e serviços. A exportação é importante geradora de renda interna, mas é ainda mais importante como instrumento de apropriação do "estado da arte" da tecnologia mundial pelo país.
Com o valor obtido com a exportação do mais simples produto (uma sandália havaiana ou um biquíni), podemos comprar o mais sofisticado computador ou a licença para usar um produto cujo desenvolvimento custou bilhões de dólares -e também o mais inútil lápis, com uma pequena lâmpada no lugar da velha borracha, o que os chineses produzem com tanta eficiência. Tudo se encontra abundantemente disponível no grande supermercado mundial.
A estreita ligação estatística entre o crescimento das exportações e o crescimento do PIB esconde um fato importante. O que acelera o crescimento é o aumento da produtividade do trabalho, que se realiza pela incorporação de novas tecnologias embutidas nos bens de capital, nos novos materiais, nos novos conhecimentos, nas novas técnicas produtivas que podem ser importadas. Mas só podemos ter acesso a elas através das exportações. É o "quantum" das exportações, corrigido pela relação de troca, que determina nosso poder de compra do "quantum" das importações.
O poder de compra das exportações e o valor das importações devem andar em relativo equilíbrio para que o desenvolvimento se realize sem problemas externos e possa ser sustentável no longo prazo. As crises que se abateram sobre as economias "emergentes" (mesmo quando não havia liberdade de movimento de capitais) foram freqüentemente produzidas pelo descompasso entre aquelas duas variáveis.
Mas isso não é tudo. A grande revolução globalizadora das economias dos anos 90 foi misteriosamente acompanhada por uma diminuição das taxas de inflação. No início da década, o economista David H. Romer sugeriu que foi exatamente a generalizada abertura para o comércio exterior que reduziu a inflação no mundo. Um recentíssimo trabalho de dois competentes economistas do IPEA (Sachsida, A. Mendonça, M.J.C. "Inflation and Trade Openness", Texto para Discussão nš 1148, janeiro de 2006), usando dados de 152 países no período 1950-1992, confirma, com método mais sofisticado e apropriado, a conjectura de Romer: o grau de abertura comercial é fator decisivo no controle da inflação.
Logo, a maior abertura comercial feita com inteligência e paciência ajuda tanto o crescimento como o controle da inflação.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
@ - dep.delfimnetto@camara.gov.br


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