São Paulo, terça-feira, 08 de maio de 2007

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SÉRGIO DÁVILA

Conversas prazerosas

A RAINHA ELIZABETH 2ª está em visita aos EUA para comemorar os 400 anos do primeiro assentamento permanente em língua inglesa da então colônia. Já havia feito o mesmo nos 350 anos, o que dá nova dimensão ao termo "estabilidade no emprego". Ontem, ela e o príncipe Philip eram recebidos em jantar na Casa Branca.
A soberana passa por uma de suas fases mais "pop", conseqüência principalmente de um filme oscarizado que a apresentou a novas gerações ignorantes da existência de uma Elizabeth e de um império que um dia comandou as ondas do mar -aliás, Buckingham apressou-se em dizer que, não, a rainha não pretende assistir a "A Rainha".
Ela chega aos EUA num momento em que seu anfitrião, George 2º, passa ele próprio por sua fase "rainha da Inglaterra", no sentido dos dicionários, de alguém com poder de direito, não de fato. Por conta de sua condução da Guerra do Iraque, o presidente Bush amarga popularidade negativa recorde.
Com um Congresso atuante e hostil, que ameaça fazê-lo governar por vetos, e um gabinete em que cada membro parece ter combinado a vez e o mês em que meterá os pés pelas mãos, o republicano corre o risco de passar os 622 dias que lhe restam trancado na Asa Oeste, a vagar, como o fantasma do rei Arthur. O "legado" do presidente respinga na biografia de outro britânico.
O primeiro-ministro Tony Blair, chamado por seus críticos "o poodle de Bush", deixa o poder nas próximas semanas com o rabo entre as pernas. O premiê trabalhista demorou a questionar os motivos e a suspeitar da inteligência que levaram os EUA a invadir o Iraque e o Reino Unido a embarcar junto.
Sua gestão será marcada para sempre pela submissão cega, fundamental para o início de uma guerra que custa a vida de dezenas de milhares de pessoas inocentes e desestabiliza ainda mais o Oriente Médio, ao fazer do Iraque solo fértil para xiitas e sunitas reviverem diferenças.
O assunto não faria parte do encontro de ontem. "Vamos deixá-los ter conversas prazerosas, que reflitam nossos laços antigos", disse ontem o porta-voz da Casa Branca quando indagado se o Iraque estaria na pauta de Bush e da rainha.
Entre garfadas de carneiro assado com molho "chanterelle" e bebericos de Peter Michael "Les Pavots" 2003, um cabernet do Sonoma, os dois devem ter comentado o clima (fez sol o dia inteiro) e falado das "crianças" (as gêmeas Bush, uma das quais estaria presente, os sete netos da rainha, um dos quais a chama de "Super Vó").
Horas antes, 68 pessoas morreram e 67 ficaram feridas num ataque em Bagdá. Convenhamos, não é tópico para "conversa prazerosa" entre a realeza.


sdavila@folhasp.com.br

SÉRGIO DÁVILA
é correspondente em Washington.


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