São Paulo, terça-feira, 08 de julho de 2008

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CARLOS HEITOR CONY

Machado e a bossa nova

RIO DE JANEIRO - A tradição de comemorar aniversários redondos tem lá suas motivações e até mesmo sua utilidade. Em termos midiáticos, contudo, descamba para a redundância que torna insuportável a repetição dos mesmos comentários e a busca alucinada por novas interpretações. Somando tudo, o excesso termina chateando os consumidores.
Nada contra o centenário da morte de Machado de Assis, mas tudo a favor. Tampouco pelo cinqüentenário da bossa nova, que, ao contrário de Machado, é um acontecimento datado na história da nossa música popular.
Contudo, chega-se a um ponto de saturação indesejável, não apenas pela insistência, mas pela repetição dos mesmos conceitos. Devoto de Machado, não agüento mais ouvir falar no presumível adultério de Capitu nem em seus olhos oblíquos e dissimulados de ressaca. Prefiro a loucura de Rubião, o herdeiro de Quincas Borba que descobriu o direito do vencedor às batatas.
Quanto à bossa nova, sem contestar sua importância e seu sucesso, continuo achando que "Garota de Ipanema", carro-chefe do movimento, é de uma chatice avassaladora, sobretudo em sua segunda parte. De Tom, prefiro "Samba de uma nota só", parceria com Newton Mendonça, e "Lígia". Mas o melhor produto da bossa nova, para meu gosto pessoal, é "Maria Ninguém", de Carlos Lyra, na versão cantada por Brigitte Bardot.
Gosto também dos clássicos gravados por João Gilberto, como "Bolinha de papel", de Geraldo Pereira, e "Pra machucar meu coração", de Ary Barroso. Músicas anteriores ao movimento, mas que se tornaram novas na interpretação do cantor baiano.
Detesto com todas as veras d'alma os diminutivos nas letras de Vinicius de Moraes: "Pois há menos peixinhos a nadar no mar do que os beijinhos que darei na sua boca". Aqui, ô!


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