São Paulo, sábado, 08 de dezembro de 2007

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IGOR GIELOW

Uma era sem líderes

SE OS EVENTOS que vão definindo esse começo de era são conhecidos, e eles têm um marco simbólico no 11 de Setembro, há uma constatação a ser feita sobre seus protagonistas: o mundo do século 21 é um mundo até aqui sem gigantes morais. Escaneie o mundo atrás de líderes a que se pode dar o título de grande. O resultado é zero, e isso não é necessariamente bom ou ruim; apenas é.
Comecemos pelos EUA, único país realmente global do ponto de vista de projeção de poder, de capacidade tanto de fazer estrago como de promover o bem. George W. Bush passará à história como um Roosevelt? Não. Parvo é uma qualificação mais provável, e os candidatos à sua cadeira não inspiram nenhum sentimento melhor.
Desloque-se para a China comunista, o bicho-papão de dez entre dez debates geopolíticos. A foto tirada dos membros do Politburo ao fim do congresso do PC deste ano dizia tudo: uma burocracia uniforme. Atravesse o mar do Japão e chegamos a uma coleção de políticos indistintos -vez ou outra aparece um Koizumi, mas passa logo. Na Rússia ressurgente, enquanto o petróleo estiver caro, o timoneiro é Vladimir Putin. Ele pode ser tudo, menos um líder político vibrante. A recente campanha eleitoral parlamentar é um ótimo exemplo: era toda sobre Putin, mas ninguém consegue definir o que ele quer além de poder czarista.
A Europa toda parece uma amálgama amorfa de supostos liberais, pretensos socialistas e falsos reformistas. Não há figura mais cinzenta que o premiê Gordon Brown, nada tão provinciano quanto a chanceler Angela Merkel. Volta e meia surge um Sarkozy, mas ele lembra demais em estilo Silvio Berlusconi para ser levado a sério.
Um ou outro fóssil vivo ainda está no jogo, como Mandela e Fidel, mas são apenas sombras. Os funerais de João Paulo 2º e de Iasser Arafat foram, de certa forma, cerimônias de adeus ao século 20.
Alguém vai lembrar que há a colorida procissão dos "nossos guias" na América Latina. Socorro. Chávez, como figura moral, é nulo. Lula pode entrar para a história como um bom ou mau presidente, mas sua importância mundial se restringe ao papel que cabe a um líder político brasileiro hoje: algo lateral.
Essa despersonalização do mundo político, como resultado do colapso do sistema de poder da Guerra Fria e da ascensão da globalização corporativa aliada às comunicações abundantes, é inexorável? Em 1910, Norman Angell argumentou que a integração das economias européias tinha chegado a um grau de sofisticação que tornava o militarismo, o jogo de poder baseado em grandes atores uma "Grande Ilusão" -título de seu livro. O mundo estava globalizado, era seu ponto. Durou apenas quatro anos para ser desmontado.


IGOR GIELOW é secretário de Redação da Sucursal de Brasília.


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