São Paulo, domingo, 09 de janeiro de 2011

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DANIEL BERGAMASCO



Das dezenas de vídeos caseiros em português no YouTube que ensinam a dar nó em gravata, um punhado tem na casa de 1 milhão de acessos.
Há lições em 30, 40, 50 segundos. É passar o tecido aqui e lá, a ponta pra cá e sair por aí engravatado.
No país em que o número de matriculados em universidades saltou de 2,3 milhões em 1999 para 6 milhões em 2009, são ensinamentos que viram hit. Tem muita gente usando a primeira gravata, empunhando o primeiro diploma da família, fazendo MBA.
De relance, esse movimento de diplomas e nós bem atados parece até a face educacional de um Brasil que sai da coadjuvância em quase tudo, a reboque da economia. Mas é só uma piscadinha.
O que está em alta é menos a educação para preparar o futuro e mais uma formação pragmática para demandas corporativas por gente graduada a tempo de fazer girar a roda dos departamentos de vendas, dos RHs, do controle de qualidade das empresas.
É um ciclo que ajuda o país a crescer como está crescendo, mas que, com a pressa de quem tem só 30 segundos para aprender um truque de vestuário e só valoriza as lições que podem ser úteis no aqui e agora, para por aí, sem reforçar alicerces intelectuais e técnicos para o longo prazo.
Não causa surpresa que, em exames comparativos de desempenho, as conclusões sobre o Brasil são muitas vezes constrangedoras.
Um deles, coordenado pela OCDE (organização de nações desenvolvidas) e publicado no mês passado, mostra que nossos adolescentes têm o mesmo nível de leitura dos de Trinidad e Tobago -e a comparação com países como a China é um massacre.
Diante de rankings parecidos, o MEC e os governos estaduais e municipais demonstram contentamento ao dizer que, vá lá, mesmo que devagar, estamos melhorando.
Nem nas campanhas eleitorais a educação mereceu promessas realmente agressivas, como uma revolução na carreira de professores. O problema é que nem todo o mundo pensa assim.
Tome-se até a Índia, país em que não faltam índices de precariedade, mas que faz inveja pela descoberta de vocação educacional para tecnologia (qual será a nossa?), cuja ambição não é só a de ser bom, mas de ajudar a dar as cartas.
Em 2010, Bollywood bateu recordes de público com o filme "3 Idiots" (3 idiotas), comédia sobre a pressão violenta por desempenho em faculdades de engenharia.
A fita retrata entre piadas e danças um drama real do país, a proliferação de suicídios de estudantes com desempenho insatisfatório que não conseguem mais encarar os professores e os pais.
Ninguém vai defender uma nação de neuróticos, mas o caminho suave que trilhamos também tem algo de suicida.

DANIEL BERGAMASCO é editor-adjunto de Cotidiano .


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