São Paulo, domingo, 09 de março de 2008

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Paradoxo das ONGs

MUITA COISA irregular pode ser investigada pela CPI das ONGs, e o noticiário recente tem sido pródigo em identificar potenciais focos de escândalo. Nos ministérios do Trabalho e dos Esportes, encabeçados respectivamente por um pedetista e um pecedobista, realizaram-se acordos com entidades cujos diretores são militantes do PDT e do PC do B.
Há ainda o caso, também revelado por esta Folha, de quatro ONGs que mantêm laços próximos com políticos do PT e do PMDB. Ao que tudo indica, um sistema articulando verbas públicas, projetos sociais e feudos partidários tende a configurar-se como prática política generalizada no país. Haveria já material, sem dúvida, para mais de uma única CPI.
Uma reflexão mais ampla, entretanto, desde já se impõe. Em tese, seria de esperar que entidades da sociedade civil pudessem sobreviver com recursos próprios. Na prática, cria-se uma espécie de organismo híbrido, ao mesmo tempo não-governamental e dependendo, para sobreviver, de verbas estatais.
Assim, de um lado o poder público se mostra incapaz de atender as carências sociais da população, abrindo espaço para as ONGs; de outro, revela-se onipresente, desvirtuando a autonomia que estas idealmente deveriam possuir.
Os próprios partidos, tantas vezes marcados pela falta de enraizamento social, parecem encontrar nas ONGs uma forma peculiar de relacionamento com a população, funcionando como intermediários do assistencialismo estatal. Cria-se, deste modo, um paradoxo, talvez tipicamente brasileiro: a esfera do não-governamental se confunde com a do paraestatal, acentuando, ainda e sempre, as incapacidades da sociedade brasileira de desvencilhar-se do sistema governamental que a sufoca.


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