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CARLOS HEITOR CONY
O embrião da bicicleta
RIO DE JANEIRO - Na crônica
anterior, não manifestei opinião
pessoal sobre as pesquisas com células-tronco. Limitei-me a estranhar que, ao descobrirem que o Estado é laico, a maioria dos analistas
condena a Igreja Católica, proibindo-a de ter opinião sobre o assunto.
Desde 1891 que a igreja é separada
do Estado, mas a separação não a
impede de manifestar o que pensa e
aconselha aos seus adeptos.
Outras religiões, seitas, associações científicas ou de classe fazem o
mesmo, e nenhuma delas tem jurisdição sobre o Estado, embora exerçam influência sobre a opinião pública, a qual não pode ser confundida com o Estado.
Costumo dizer que não entendo
nada de nada, e embora a ciência
ainda não tenha determinado
quando começa a vida, discordo da
teoria que considera a fecundação
como o início de tudo. Se alguém
amontoar aleatoriamente dois pedais, duas rodas, um selim, uma
corrente, dois pára-lamas, um guidão e uma campainha, não terá feito uma bicicleta. Precisará montar
esses elementos dentro de uma ordem, cada coisa em seu lugar, para
obter o que deseja.
Na formação de uma nova vida,
logo após o espermatozóide fecundar o óvulo, estarão presentes todos
os elementos para a criação de um
feto. Mas o processo de montar um
novo ser humano não é imediato.
Há uma corrente que acredita na
formação embrionária do cérebro
como o início de uma vida paralela e
depois independente do organismo
da mãe.
Se assim for, as pesquisas com
embriões não podem ser consideradas uma forma de homicídio. Não
haverá vida no embrião logo após a
fecundação, seja no útero, seja in vitro. A última palavra não será dada
pela lei civil nem pela religião, mas
pela ciência. Enquanto isso, é lícito
que cada um pense o que quiser
-inclusive o cronista.
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