São Paulo, domingo, 09 de abril de 2006

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CLÓVIS ROSSI

Uma história de frustrações

SÃO PAULO - Ser repórter só tem uma e imensa graça: me permitiu ser testemunha ocular da história do meu tempo. É verdade que o tempo passa tão velozmente que a gente nem se dá conta disso, a não ser quando aparecem provas, o que casualmente aconteceu ontem.
Participei ou fiz o texto principal de sete das nove capas da Folha reproduzidas na reportagem da Ilustrada que anuncia a nova edição do livro com as primeiras páginas históricas do jornal. Nas duas outras ou nem havia nascido (a de 1921) ou tinha 10 anos (a morte de Stálin, em 1953). De todo modo, trabalhei em textos sobre a segunda morte tanto de Stálin como de Lênin (a queda do Muro de Berlim, o fim do comunismo).
O diabo é que, às vezes, a história acaba sendo repetitiva.
Veja o título "A Nação Frustrada", de abril de 1984, o sentido lamento do jornal pela derrota da emenda constitucional que restabelecia as eleições diretas para a Presidência.
Que noite aquela. O jornal despachara para Brasília uma brigada de repórteres em modo de combate, não de jornalismo apenas. Tanto que o editorial, também na capa, dizia: "Cai a emenda, não nós". O pronome aí não era recurso tipográfico ou de linguagem, mas assumia o envolvimento de todos nós na batalha perdida e anunciava que a bandeira não seria enrolada.
Exatos dez anos antes, mas por outro jornal, cobrira a Revolução dos Cravos em Portugal, que levara o país à democracia (e, dela, a um extraordinário progresso). Meses antes, voltara da Argentina também redemocratizada em meio a uma festa cívica sem precedentes, capaz de juntar até adversários na comemoração do resgate das liberdades públicas.
Esperava ter a chance de ser testemunha ocular da festa no meu próprio país. Não houve, nunca houve, pelo menos até agora, nada que realmente mudasse estruturalmente o Brasil. Parece um país condenado a ser campeão mundial no quesito frustração vence a esperança.


@ - crossi@uol.com.br


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