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CLÓVIS ROSSI
Uma história de frustrações
SÃO PAULO - Ser repórter só tem uma
e imensa graça: me permitiu ser testemunha ocular da história do meu
tempo. É verdade que o tempo passa
tão velozmente que a gente nem se dá
conta disso, a não ser quando aparecem provas, o que casualmente aconteceu ontem.
Participei ou fiz o texto principal de
sete das nove capas da Folha reproduzidas na reportagem da Ilustrada
que anuncia a nova edição do livro
com as primeiras páginas históricas
do jornal. Nas duas outras ou nem
havia nascido (a de 1921) ou tinha 10
anos (a morte de Stálin, em 1953). De
todo modo, trabalhei em textos sobre
a segunda morte tanto de Stálin como de Lênin (a queda do Muro de
Berlim, o fim do comunismo).
O diabo é que, às vezes, a história
acaba sendo repetitiva.
Veja o título "A Nação Frustrada",
de abril de 1984, o sentido lamento do
jornal pela derrota da emenda constitucional que restabelecia as eleições
diretas para a Presidência.
Que noite aquela. O jornal despachara para Brasília uma brigada de
repórteres em modo de combate, não
de jornalismo apenas. Tanto que o
editorial, também na capa, dizia:
"Cai a emenda, não nós". O pronome
aí não era recurso tipográfico ou de
linguagem, mas assumia o envolvimento de todos nós na batalha perdida e anunciava que a bandeira não
seria enrolada.
Exatos dez anos antes, mas por outro jornal, cobrira a Revolução dos
Cravos em Portugal, que levara o
país à democracia (e, dela, a um extraordinário progresso). Meses antes,
voltara da Argentina também redemocratizada em meio a uma festa cívica sem precedentes, capaz de juntar
até adversários na comemoração do
resgate das liberdades públicas.
Esperava ter a chance de ser testemunha ocular da festa no meu próprio país. Não houve, nunca houve,
pelo menos até agora, nada que realmente mudasse estruturalmente o
Brasil. Parece um país condenado a
ser campeão mundial no quesito
frustração vence a esperança.
@ - crossi@uol.com.br
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