São Paulo, sábado, 09 de agosto de 2008

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GUSTAVO FRANCO

Números da crise

AS PERDAS de bancos no exterior, em decorrência da crise das hipotecas de baixa qualidade, ou das operações estruturadas alavancadas turbinadas e difíceis de explicar, continuaram estonteantes no segundo trimestre de 2008.
Para avaliar esses números, convém separar os atingidos em dois grupos. Um que vamos chamar de "protagonistas", composto de uma dúzia exata de bancos, e outro compreendendo a totalidade dos envolvidos.
Os protagonistas tiveram perdas reconhecidas em seus balanços no valor de US$ 275 bilhões, mas conseguiram se recapitalizar em cerca de US$ 210 bilhões. Para o grupo maior, as perdas estariam rondando os US$ 500 bilhões, e as recapitalizações, atingindo cerca de US$ 350 bilhões.
Para os 12 protagonistas, vale ressaltar que o seu patrimônio, com esse capital novo e com algumas aquisições, aumenta de US$ 810 bilhões para US$ 870 bilhões.
Mas o valor de mercado desses 12 bancos, que era cerca de US$ 1,5 trilhão, ou seja, algo próximo do PIB do Brasil, está hoje em cerca de US$ 1 trilhão, ou seja, 15% a mais que o seu patrimônio. Esse "ágio" já esteve bem mais baixo logo antes do anúncio dos resultados do segundo trimestre, mas experimentou uma boa recuperação.
No grupo de protagonistas, todavia, há diferentes situações. Há casos de bancos que perderam 100% do patrimônio que tinham antes da crise e se recapitalizaram quase totalmente. Outros já tiveram sérias crises de liquidez, resolvidas graças a novos mecanismos de financiamento disponibilizados pelos bancos centrais dos EUA e da Europa. E há os casos das grandes securitizadoras "patrocinadas" pelo governo americano, Fannie Mae e Freddie Mac, que talvez tenham perdas maiores que esse grupo todo e que nem estão nessa conta.
Há muitas novidades nesta crise.
A maior delas talvez seja a facilidade com que apareceram US$ 350 bilhões para comprar novas ações de bancos internacionais de excelente reputação, mas em dificuldades muito profundas. A maior parte desse dinheiro, senão a totalidade dele, veio de fundos soberanos de riqueza de países asiáticos e do Oriente Médio. É difícil imaginar que esse dinheiro fosse aparecer na ausência dos fundos soberanos ou que esses fundos pudessem se tornar acionistas importantes desses bancos com esta facilidade em condições normais.
O fato é que, se os governos fossem implicar com os fundos soberanos, tudo isso iria custar muito caro para o contribuinte. Na verdade, é como se o contribuinte da "periferia" estivesse aliviando o do "centro". Prebish e Furtado deveriam estar vivos para testemunhar este fenômeno.

gh.franco@uol.com.br


GUSTAVO FRANCO escreve aos sábados nesta coluna.


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