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MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO
Auto-reflexão e autocrítica
MARCO AURÉLIO Garcia
prescreveu "auto-reflexão" para a imprensa, vezo subscrito por algumas redações.
Argüir toda a mídia de inventar a
mácula petista é uma contradição
em termos. Marco Aurélio converte fatos em quimeras (nunca houve
mensalão), mas os "erros" dos camaradas o desdizem. É preciso reavivar esses desvios para que o "agitprop" não logre desvanecê-los. Não
há como eludir o caudaloso valerioduto, o contrato milionário assinado por dirigente distraído, o jipe
recebido em troca de favores. Dinheiros fluem de fontes obscuras
(como o dos aloprados) para fins
escusos (como as contas paradisíacas de D. Mendonça) e surgem em
cofres recônditos (peças íntimas).
Assessores palacianos evoluem
nessa ilícita ciranda. E Visanet,
sanguessugas, bingos, Correios,
cartões institucionais?
O BNDES financia regiamente a
Telemar, que, por sua vez, ajuda o
filho do mais alto magistrado no
país a passar de tostões a milhões.
Ao se expor esse ganho, não se invadiu o círculo familiar do presidente; o fato originário foi que o
seu círculo privado invadiu o público. Invencionice? Intimidados pela
polícia não foram os autores desses
atos, mas aqueles que os deram a
conhecer.
O presidente do PT, ao censurar
a imprensa, fugiu à lógica. "Auto-reflexão" é uma cômica tautologia
comparável à do candidato-presidente, que, anunciando benefícios,
prometeu "universalidade geral" à
educação, saúde etc. Como erro de
apedeuta, admite-se tal vício lógico, mas não como lapso de um professor. A "reflexão", metáfora do
pensamento que examina a si mesmo, só pode ser "auto". Aquela gafe
trai um ato falho que denuncia arcanos da esquerda ortodoxa, a "autocrítica".
Partidos autoritários, ágeis no
domínio das consciências, adestram os filiados a ajustar suas mentes ao mandamento da burocracia
partidária, fonte de certezas que
vão da moral à ciência (o caso
Lyssenko é exemplar). O militante
interioriza doutrinas e ordens da
direção e, nessas balizas, afere atos
e conteúdos de seu espírito: faltando identidade entre convicções
próprias e verdades partidárias, ele
abjura o pensamento e cola-se à
ideologia, por mais que ela contrarie as evidências. O auto-respeito
sucumbe ao dogma.
Garcia confunde tarefeiro partidário e imprensa ao exigir, desta, o
sacrifício do intelecto. Que ele imponha silêncio obsequioso a jornalistas alinhados ao PT (há muitos),
vá lá. Mas estendê-lo à toda a imprensa e, com ela, à opinião pública
(que merece informação e juízos
independentes) vaticina dias funestos. O prosélito, aliado a velhos
gestores da ditadura, não só cala a
si próprio mas, por toda parte, usa
carga pesada para fechar espaços e
silenciar vozes autônomas.
MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO escreve às
quintas-feiras nesta coluna.
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