São Paulo, terça-feira, 09 de dezembro de 2008

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MARCOS NOBRE

15 minutos de fama

A DIPLOMACIA local deve achar que o Brasil entrou de vez para o clube dos que contam na cena internacional. Só isso pode explicar a "mentalidade belicista, de concepções apanhadas na matriz norte-americana", de que falou Janio de Freitas em seus artigos sobre a venda de foguetes para equipar aviões paquistaneses e sobre a recusa brasileira em assinar o tratado de banimento de bombas de fragmentação.
Diz-se que a diplomacia deve defender os interesses do país. O problema é saber quem decide -e como- quais são esses interesses.
E que justificativa apresenta para defendê-los.
No caso da venda de armas, o "interesse do país" não passa do interesse da indústria bélica. E, em uma sociedade violenta como a brasileira, a recusa em banir bombas de fragmentação equivale a uma justificação da brutalidade cotidiana. É o mesmo que dizer que a violência indiscriminada vale, desde que gere lucros, divisas e empregos.
Um dos mais importantes avanços do século 20 foi uma crescente e expressiva rejeição à guerra. Sim, guerras continuam acontecendo.
Mas a disposição de cidadãs e de cidadãos de se engajar nelas diminuiu a tal ponto que muitos exércitos passaram a ser compostos exclusivamente por profissionais.
Faz parte desse movimento de rejeição à guerra a proteção a não-combatentes e a limitação dos ataques a alvos propriamente militares. Bombas de fragmentação são armas de destruição indiscriminada. Segundo dados de organizações humanitárias, 98% dos alvos desses artefatos foram civis, mais de um quarto crianças. São bombas que se fragmentam em dezenas de bombas menores. Algumas explodem ao atingir o solo. Outras se transformam, na prática, em minas que podem explodir depois de meses ou mesmo anos.
O Brasil enviou apenas um observador à cerimônia de celebração do tratado. Defendeu a idéia de que o tema deveria ser debatido no âmbito da ONU, e "não em uma convenção informal". Para começar, o tratado não tem nada de informal.
E, a bem da seriedade: no que a assinatura do tratado impede que se continue o debate em outros âmbitos? No que impede que a iniciativa venha a ser incluída futuramente em uma nova convenção internacional? O Brasil só faz realmente parte do jogo quando se trata de negociações comerciais e de meio ambiente. No mais, foram as circunstâncias da atual crise econômica que alçaram o país à condição de agregado temporário do clube que manda.
Ganhou seus 15 minutos de fama no palco internacional. Deveria pelo menos saber usar esse tempo com decência moral e política.

nobre.a2@uol.com.br

MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.



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