São Paulo, terça-feira, 10 de janeiro de 2006

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Em busca de uma melhor gestão

RAUL CUTAIT

Em 1993, vivendo um curto e envolvente período como secretário da Saúde do Município de São Paulo, pude constatar que, apesar da modernidade conceitual do SUS (Sistema Único de Saúde), havia ainda um longo caminho a percorrer para que os princípios de eqüidade e universalidade pudessem ser amplamente praticados.
Alguns dos principais problemas de então continuam a ser verdadeiros: financiamento insuficiente; modelo de gestão ineficaz e ineficiente, com baixa produtividade e desperdício de recursos; baixo investimento na capacitação de recursos humanos.
Apesar dessas dificuldades e limitações, é possível afirmar que o SUS vem gradativamente melhorando, e isso graças a algumas mudanças estruturais, tais como a municipalização da saúde, que trouxe mais agilidade e, ao mesmo tempo, mais responsabilidade para os representantes locais do poder público, e a percepção de que as parcerias público-privadas poderiam agregar novos rumos em prol de melhor resolubilidade na saúde.
Quando secretário, compreendi que era fundamental o envolvimento da sociedade civil como parceira no encaminhar de soluções na área da saúde, se envolvendo com prestação de serviços, gestão, formação de recursos humanos e até mesmo com financiamento.
Tive a oportunidade de participar de discussões conceituais que levaram o governo Covas a criar as organizações sociais (OSs), quebrando amarras da administração direta de hospitais públicos, com melhoria do atendimento da população.


O setor público poderá se associar a entidades com finalidade lucrativa na busca de melhoria do atendimento de saúde?

Assim, vejo com entusiasmo a aprovação do projeto de OSs para a saúde no município de São Paulo. Creio que o modelo proposto pelo prefeito José Serra, um ex-ministro da Saúde que mostrou sensibilidade no setor, deverá ir além, pois se definiu que as OSs atuarão no aprimoramento do sistema de referência e contra-referência regionalizado e hierarquizado e que será instalado um indispensável sistema de avaliação, que deverá trocar "achismos" por dados.
Pertenço ao grupo dos que acreditam que a função precípua do Estado é normatizar e controlar as atividades relacionadas com a saúde, e não ser obrigatoriamente o prestador de serviços.
As organizações sociais são um modelo de integração do setor público com a sociedade civil que abre espaço para entidades filantrópicas darem contribuições mais efetivas para a saúde, podendo até gerar caminhos diferentes daqueles definidos por obtuso decreto federal que define filantropia por percentual de atendimentos SUS.
Com criatividade e negociação com os Poderes municipais e estaduais, essas entidades, como já vem acontecendo com algumas delas, podem participar do aprimoramento do setor público direcionando as atividades que realizam para além do atendimento, estendendo-as para a gestão e a formação de recursos humanos.
A pergunta para a qual ainda é cedo para dar uma resposta é: haverá espaço para, um dia, o setor público se associar com entidades com finalidade lucrativa na busca de melhoria do atendimento de saúde? Em que situações?
Qualquer resposta ou proposição merece ser antecedida por ampla reflexão e debate entre aqueles que se preocupam com o bem maior, que é oferecer saúde digna para os cidadãos brasileiros.

Raul Cutait, 55, cirurgião gastrenterologista, professor associado do Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da USP, é presidente do Instituto para o Desenvolvimento da Saúde. Foi secretário da Saúde do Município de São Paulo (gestão Paulo Maluf).
@ - rcutait@hsl.org.br


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