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O Rubicão de Chávez
Não cabe ao Brasil imiscuir-se em assuntos internos da Venezuela; distanciar-se de Chávez, porém, é um imperativo
O PRESIDENTE Hugo Chávez vai dissolvendo as
poucas dúvidas que
ainda restam acerca de
seu pendor autoritário. Pôs-se
agora em marcha batida para fazer da Venezuela a segunda ditadura das Américas -se o regime
cubano sobreviver até lá.
A estatização dos setores de telefonia e eletricidade, anunciada
com pompa como ato inaugural
do terceiro mandato, não é o que
mais preocupa na agenda "socialista" de Chávez. Usar fundos públicos para indenizar empresas
privadas e submeter a prestação
de serviços à costumeira ineficiência empresarial do Estado é
apenas uma opção obsoleta.
Supõe-se, evidentemente, que
o chavismo não lance mão do
confisco de bens, o que seria um
esbulho contra empresas venezuelanas e estrangeiras. Supõe-se, também, que não se valha do
monopólio na telefonia para
censurar a internet, como ocorre
na China, no Irã e em Cuba.
Não é preciso saber que forma
tomarão as estatizações, no entanto, para temer pelo futuro da
democracia na Venezuela. Quando requer poderes para ditar
"leis revolucionárias" por decreto, quando pleiteia a reeleição ilimitada e quando revoga por razão ideológica a concessão de um
canal de TV (ameaçando fazer o
mesmo com os outros grupos de
oposição), Chávez atinge direitos
civis e políticos fundamentais.
A Organização dos Estados
Americanos é regida por uma
cláusula democrática -outrora
apenas retórica, mas que foi reafirmada em 2001 pelos países-membros. Assegurar as liberdades da democracia é condição
para integrar a entidade. O secretário-geral da associação, o
chileno Jose Insulza, zelava pela
carta da OEA quando manifestou estranheza diante da não-renovação da licença de funcionamento da mais antiga rede de rádio e TV venezuelana.
Insulza foi tratado com impropérios por Chávez, que agora está em campanha pela substituição do secretário-geral. Na empreitada, o líder venezuelano fará pressão sobre o Mercosul para
que o bloco embarque em sua investida contra Jose Insulza.
Surge nova oportunidade para
o Brasil reformar a sua diplomacia em relação a Chávez. Não
basta o Itamaraty moderar o venezuelano nos bastidores. Brasília deveria manifestar solidariedade ao dirigente da OEA, atacado com brutalidade por um chefe
de Estado associado. Deveria, em
nome da cláusula democrática
que também vigora no Mercosul,
transmitir a Chávez preocupação com os rumos de seu regime.
Hugo Chávez, é bom frisar, não
foi consagrado pelas urnas nas
eleições de dezembro. Quase
40% dos eleitores votaram contra estender seu mandato até
2013. A oposição não dispõe de
uma quantidade proporcional de
assentos no Congresso porque
cometeu o erro de boicotar o
pleito legislativo de 2005 -para
não mencionar a sua desastrosa
e injustificável opção pelo golpismo três anos antes.
Não cabe ao Brasil tomar atitude que configure ingerência em
assuntos internos da Venezuela.
Mas devemos manter distância
diplomática de um governo vizinho prestes a cruzar o Rubicão
rumo à ditadura.
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