São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 2009

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O discurso de Obama


Futuro presidente americano aposta no seu poder de mobilização para vencer resistências a novos gastos do governo

ELOQUÊNCIA é algo que o presidente eleito dos Estados Unidos, Barack Obama, já deu mostras de possuir. O discurso com que apresentou as linhas de seu plano econômico, nesta quinta-feira, revestiu-se dos mesmos recursos de envolvimento, serenidade e argumentação que singularizaram sua campanha rumo à Casa Branca.
Parecem hoje comparativamente pequenos, todavia, os desafios que Obama se propunha a resolver quando sua estrela política iniciava uma trajetória de ascensão. Assuntos como a retirada das tropas do Iraque e a reconquista da legitimidade do poder americano ocupavam espaço significativo nas atenções gerais, e a figura até então pouco conhecida do senador mestiço de Illinois soube galvanizar um sentimento já maduro para as mensagens de mudança.
A violência da crise econômica, sem dúvida o fator afinal decisivo na vitória do candidato democrata, reduziu a um papel secundário aquele gênero de preocupações. Barack Obama se vê às vésperas de assumir a Presidência diante de uma situação inédita no pós-Guerra, na qual o receituário das providências disponíveis parece irremediavelmente obsoleto.
Um programa de grandes gastos públicos -cerca de U$ 800 bilhões- foi anunciado por Obama em seu discurso. O futuro presidente promete investir na recuperação de estradas e edifícios federais, na duplicação das fontes atuais de energia alternativa, na extensão dos serviços de banda larga por todo o território, na modernização das salas de aula, na informatização dos serviços de saúde.
Pode-se notar a desproporção entre os diversos itens dessa lista. Varia consideravelmente o peso relativo que cada um dos projetos anunciados possa ter na recuperação da economia.
Cortes expressivos nos impostos da classe média, além da disposição de injetar recursos nos Estados mais atingidos pela crise, completam um programa que, em resumo, representa considerável (e, ainda assim, talvez insuficiente) aumento no déficit público americano.
A dificuldade política imediata, para o presidente eleito, será convencer o Congresso a aprovar rapidamente esse plano de despesas. É profundamente arraigada na cultura política americana a resistência aos gastos governamentais.
"Sei que alguns ficarão céticos com esse plano", disse o futuro presidente, referindo-se às grandes (e impopulares) operações já efetuadas com dinheiro público em nome da salvação da economia.
Obama acentuou, por isso mesmo, os tons sombrios na sua descrição da conjuntura e seus apelos ao patriotismo do Congresso. Precisa, ao mesmo tempo, diminuir a carga de expectativas irrealistas que cercam sua posse, e exaltar as esperanças de mobilização numa empreitada que se faz em terreno incerto. Por maior que seja a eloquência de um governante, são notórios seus limites diante de tal dilema.


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