São Paulo, quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Oportunidade na pesquisa clínica

MORTON SCHEINBERG


Apesar de sermos um país com centros de excelência, ficamos à mercê de órgãos reguladores que padecem de problemas de organização


Um dos problemas que a área de pesquisa clínica com pacientes atravessa no Brasil é a morosidade na aprovação de protocolos pelos órgãos reguladores. Isso é verdade especialmente no caso da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
No nosso país, a aprovação regulatória das pesquisas demora, em média, o dobro -se não o triplo- de tempo para aprovação dos Estados Unidos, do Canadá e dos países da União Europeia.
As implicações desse atraso vão desde impedir o acesso a novos medicamentos para pacientes até evitar que médicos tenham acesso a inovações terapêuticas. Essa morosidade resulta em uma participação cada vez menor do mercado anual global, de US$ 50 bilhões.
Apesar de sermos um país com centros de excelência, ficamos à mercê de órgãos reguladores que padecem de problemas de organização. Projetos são extraviados, pareceres são solicitados a técnicos alheios à pratica médica etc.
A própria Conep não respeita as regras impostas por ela mesma.
Quando o projeto de pesquisa inclui cooperação internacional, o desafio é ainda maior.
Nesses casos, é preciso a aprovação da Anvisa, que duplica a análise do Conep e que também não respeita os próprios prazos.
Segundo a atual direção da Conep, o atraso não ocorre pelos motivos acima mencionados, mas pelo cuidado e pelo respeito aos voluntários que não compreendem os termos técnicos de consentimento.
Os centros de pesquisa possuem médicos e coordenadores capazes de explicar com detalhes os consentimentos usados. O Conep alega também a falta de garantias de acesso ao tratamento após o estudo e antes da disponibilidade comercial do mesmo.
Essa decisão não cabe a um órgão regulador, mas aos médicos que cuidam do paciente, que devem avaliar se querem ou não continuar com a medicação.
Os argumentos da agência ocultam o cerne do problema: existem falhas estruturais no processo de aprovação dos projetos pelo órgão brasileiro responsável pela boa condução e pelo desenvolvimento da pesquisa clínica.
O ministro Alexandre Padilha tem em suas mãos uma oportunidade de mudar esse cenário, em que os pesquisadores brasileiros sempre ficam para trás.
A maioria dos projetos ocorre simultaneamente em vários países e quem começa por último, como frequentemente acontece no Brasil, fica nessa mesma posição na lista de inclusão de pacientes. Todos perdem: pacientes e pesquisadores.
É necessário fazer reformas rápidas na Conep, tais como modernização tecnológica, descentralização dos mecanismos de avaliação, respeito aos prazos e eliminação da análise dupla (Anvisa e Conep).
Só dessa maneira o Brasil vai avançar e se colocar no lugar em que deveria estar no cenário da pesquisa clínica internacional.

MORTON SCHEINBERG, médico clínico e pesquisador em reumatologia e imunologia do Hospital Israelita Albert Einstein, PhD (Universidade de Boston/EUA), livre-docente em imunologia (USP), é coordenador de pesquisas clínicas e diretor científico do Hospital Roberto Abreu Sodré (AACD).

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