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O governo, o FMI e o círculo vicioso
ANTONIO DELFIM NETTO
A economia brasileira vive um momento crucial. Livrou-se da armadilha
montada pelo dramático erro da política cambial que persistiu por quatro
anos. Tem agora, depois de mais alguns equívocos, a possibilidade de encontrar uma nova orientação que possibilitará uma rápida redução da taxa
de juro real e expansão da atividade
econômica comandada pelas exportações. Não precisando mais condicionar a política de juros à defesa de um
câmbio valorizado, poderemos ir caminhando na direção do equilíbrio interno (estamos longe dele, como prova o baixo crescimento e alto desemprego) e externo (que também está
distante, como prova o déficit insustentável do balanço em contas correntes). Isso exige, simultaneamente, um
grande esforço fiscal (que estamos
ameaçando realizar há anos) e um
movimento cambial que o mercado
nos impôs.
Somos, infelizmente, prisioneiros de
um outro dilema, semelhante ao que
os economistas chamaram de "problema do peso". Peso, aqui, é a designação da moeda mexicana. O "problema do peso" se refere a uma situação em que os agentes formam expectativas a respeito de mudanças bruscas em alguma variável fundamental,
em geral pela baixa credibilidade da
política econômica. Como a taxa de
câmbio nominal é o preço de um ativo, os seus preços se formam em função do comportamento futuro das variáveis. É por isso que ela pode atingir
níveis que "ex post" contradizem as
expectativas "racionais".
Qual é a variável sobre a qual os
agentes têm hoje uma expectativa de
mudança brusca? Basta observar o seu
comportamento: é a relação dívida
pública/PIB, combinada com uma taxa real de juros fixada muito acima de
qualquer necessidade. Isso cria o círculo vicioso retratado abaixo e exerce
pressão para a fuga dos capitais que
temem ficar aplicados em reais.
Se há dúvida sobre a solvência da dívida interna, abandona-se o real e acelera-se a saída de capitais, o que pressiona a taxa cambial. A política suicida de elevar o juro (com a ilusão de
reduzir a saída de capitais), combinada com o alto estoque da dívida, aumenta a dúvida e pressiona a taxa
cambial e assim por diante, repetindo
o ciclo. Enquanto isso, destroem-se os
ativos das empresas brasileiras e reduz-se o ritmo de crescimento econômico.
Só podemos nos livrar disso com
uma rápida, enérgica e sutil ação governamental que ajude a acelerar as
exportações, a reduzir importações, a
restabelecer as linhas de crédito internacionais e a reduzir a taxa de juros
real, para inverter as expectativas. Não
adianta esperar que o "mercado"
caia do céu! Um homem com 1,70 m
de altura pode ser afogado com 1,71 m
de água. Não é preciso 3,4 m! Quem
precisa de 39% de taxa de juros? Nem
o FMI!
Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta
coluna.
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