São Paulo, segunda-feira, 10 de março de 2003 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES A classe média vai ao paraíso JOSÉ ARISTODEMO PINOTTI
A ANS (Agência Nacional de Saúde), identificando o crescente número de planos de saúde inadimplentes
e usuários mal atendidos, propõe a cobrança de mais 1% ao ano de uma mensalidade para a criação do Fundo Garantidor de Beneficiários de Planos de
Saúde, o FGBPS. É pouco para o usuário, engorda o caixa da ANS mas não resolve, só prolonga a agonia de todos. A
questão é mais profunda.
Esse mesmo governo, após a regulamentação dos planos, começou a apertá-los com exigências crescentes, o que os está levando à inadimplência. Novamente é o usuário o que mais sofre. São prejudicados também médicos e demais profissionais, pelas baixas tabelas de pagamento, salários e ruins condições de trabalho. Os hospitais prestadores estão à beira da falência. Isso tudo muda substancialmente a situação da saúde e a sua solução nos dias de hoje. Não podemos ignorar os 40 milhões de brasileiros que dependem dos planos e recebem atendimento falho, especialmente os que pagam mensalidades mais baratas. Devemos levar em conta também o aumento do desemprego e, portanto, a inadimplência dos usuários. Várias empresas que mantinham planos coletivos deixaram de dar cobertura de assistência médica aos seus empregados, agravando a situação. O SUS, que pelos precários financiamento e gestão está com enorme demanda reprimida, deverá tê-la agravada com esse refluxo de pacientes. É o caminho do caos e não será com a ANS, órgão esdrúxulo, nem com fontes adicionais do tipo FGBPS -chamado por Elio Gaspari de "Foste Garfado Bonito pela Burocracia da Saúde"- que se resolverá a questão. Não há outra saída, é preciso reorganizar o sistema público de saúde e abrigar aí os usuários de planos artificialmente baratos e enganosos. Isso é possível. É apenas uma complicada e seríssima questão de gestão, criatividade e reestruturação da nossa política de saúde. A presença de parte da classe média no sistema público não só é necessária para ela, que não pode arcar com planos caros, como o é para aprimorar o próprio sistema, pois este estamento conhece seus direitos e exige um atendimento digno, exercendo o controle social que é a alma da democracia. Saúde não é coisa barata nem simples e não é possível fazer milagres. Precisamos de uma política com princípios universais e prática nacional, não apenas reagindo aos fatos de forma emergencial, mas com programação estrutural que se antecipe a eles para garantir a ética e a eficiência do sistema privado e a organização e o aprimoramento do sistema público, que é pré-pago pelos impostos. José Aristodemo Pinotti, 68, deputado federal pelo PMDB-SP, é professor titular de ginecologia da Faculdade de Medicina da USP. Foi secretário da Educação (1986-87) e da Saúde (1987-91) do Estado de São Paulo, secretário da saúde do município de São Paulo (2000) e reitor da Unicamp (1982-1986). Texto Anterior: Frases Próximo Texto: José de Filippi Jr.: Vinte anos da "cidade vermelha" Índice |
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