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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Brasil está menos vulnerável a
crises econômicas internacionais?
SIM
Contas externas arrumadas
LUIZ FERNANDO FIGUEIREDO e CAIO MEGALE
NAS ÚLTIMAS semanas os mercados financeiros vêm mostrando alta volatilidade. A gênese dessa turbulência foi a incerteza
sobre o futuro da economia americana e a extensão do processo de alta
dos juros que o Federal Reserve vem
levando a cabo. A conseqüência tem
sido a maior aversão a risco por parte
dos investidores internacionais, que
vêm reduzindo sua exposição a mercados arriscados.
Esse movimento provavelmente
marca o início do fim de um dos períodos de maior abundância de liquidez da história dos mercados financeiros internacionais, que vinha sendo observado desde o início de 2003.
Nesse período, muitos investidores
não sabiam mais o que fazer com tanto dinheiro em caixa -qualquer ativo
com retorno mais elevado era atraente, pouco importando os fundamentos que estivessem por trás dele.
Com menor liquidez daqui para
frente, os agentes serão mais seletivos, separando o joio do trigo: como
na fábula da cigarra e da formiga,
quem aproveitou os anos de bonança
para "arrumar a casa" estará mais seguro e sofrerá menos.
Sem dúvida, o Brasil foi um dos que
mais bem aproveitou os ventos externos para melhorar seus fundamentos,
especialmente no que diz respeito ao
balanço de pagamentos. Em 2001, o
país tinha déficit nas contas correntes
de 4,5% do PIB, o que, somado às
amortizações da dívida externa, exigia a captação de divisas via endividamento externo ou investimento direto de cerca de US$ 50 bilhões por ano.
A dívida externa total era próxima
de 50% do PIB, sendo quase 60% do
setor público, enquanto a parcela da
dívida interna indexada à taxa de
câmbio chegava a 30%. Ou seja, depreciações cambiais, por menores
que fossem, representavam um importante custo aos cofres públicos.
Hoje, nossas contas externas estão
arrumadas. O câmbio mais competitivo do que aquele existente nos anos
de câmbio fixo, o incentivo fiscal do
governo federal e o robusto crescimento mundial impulsionaram nossas exportações, transformando o déficit em conta corrente em um superávit próximo de 2% do PIB.
A abundância de recursos permitiu
que reduzíssemos a dívida externa
para menos de 20% do PIB e levássemos a zero a indexação cambial da dívida interna. Com o atual volume de
reservas internacionais -cerca de
US$ 65 bilhões-, a dívida liquida externa do setor público é praticamente
zero: ou seja, depreciações cambiais
não trazem mais os efeitos colaterais
fiscais indigestos que faziam com que
pequenos ajustes no câmbio se tornassem ameaça de sérias crises.
As contas externas sólidas não nos
torna imunes à volatilidade de curto
prazo dos mercados, que está ligada a
movimentos de manada e ao nível de
alavancagem apresentado pelos mercados, mas ancora o preço dos ativos,
evitando tendências de deterioração
mais prolongadas.
Apesar de os números estarem
aparecendo agora com maior evidência, essa conquista é fruto de um árduo e prolongado processo de transformações que a economia brasileira
vem passando nos últimos 12 anos,
com o fim da hiperinflação, privatizações, equacionamento das contas fiscais e adoção, com sucesso, do regime
de metas para a inflação. É mérito da
atual equipe econômica, que aproveitou o ambiente externo para limpar o
balanço de pagamentos e reduzir a
inflação, mas também de equipes anteriores, que pavimentaram a via expressa pela qual estamos trafegando.
Entretanto, o futuro positivo do
Brasil não será garantido pela qualidade das contas externas. Se aproveitamos os anos de bonança para corrigir nossos desequilíbrios no balanço
de pagamentos, não fizemos o mesmo com nossas contas domésticas.
O resultado fiscal, apesar de ainda
em linha com as metas de superávit
primário, continua mostrando uma
composição perversa e será cada vez
mais percebido como insustentável.
O próximo governo deve acenar com
medidas sólidas para reverter esse
quadro. Caso contrário, estaremos fadados a ser uma economia com juros
nominais elevados e um crescimento
decepcionante quando comparado à
média dos demais países emergentes.
LUIZ FERNANDO FIGUEIREDO , 42, é sócio-diretor da
Mauá Investimentos, conselheiro da BM&F e professor do
curso de MBA da FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), em São Paulo. Entre 1999 e 2003, foi Diretor de Política Monetária do Banco Central do Brasil.
CAIO MEGALE , 31, é economista formado pela Universidade de São Paulo, com mestrado pela PUC-RJ. Recebeu o
prêmio BNDES de Economia 2004/2005 pela dissertação
de mestrado "Fatores Externos e o Risco-País". É sócio da
Mauá Investimentos e professor do Ibmec-SP.
@ - cmegale@mauainvest.com.br
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