São Paulo, quinta-feira, 10 de junho de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Mecenato e universidade

JOÃO GRANDINO RODAS


Ou universidades públicas paulistas se conformam em obsolescer placidamente ou devem procurar outras fontes de financiamento


Em um mundo em constante evolução, para que a universidade, pública ou privada, se mantenha atualizada são necessários orçamentos cada vez maiores.
Tal fenômeno verifica-se tanto no exterior quanto no Brasil, não sendo por acaso que as universidades mais importantes do mundo sejam também as campeãs na captação de recursos.
A universidade pública brasileira absorve cerca de 25% dos universitários brasileiros, cursando os demais instituições privadas.
As universidades públicas, por serem, geralmente, as mais tradicionais, recrutam os estudantes mais preparados.
Contudo, se já existiam algumas universidades particulares de renome, nota-se hoje grande ebulição nas instituições privadas, mormente em razão do ingresso de grandes capitais, inclusive estrangeiros, no setor, o que tornará mais acirrada a disputa pelos melhores alunos.
Isso é bastante positivo, uma vez que contribui para a melhora do nível do ensino superior brasileiro.
Um dos principais problemas das universidades públicas reside exatamente na dificuldade em aumentar seu orçamento na mesma proporção das suas crescentes necessidades.
Financiar o ensino superior, infelizmente, não pode ser prioridade absoluta do poder público, pois há outras necessidades prementes, como a educação fundamental e média, a saúde, a segurança, a infraestrutura etc.
Se até pouco tempo atrás bastavam quatro paredes, lousa, giz, mesas e cadeiras, bibliotecas e laboratórios, atualmente são necessárias salas de aula dotadas de modernos meios eletrônicos, bibliotecas digitais e laboratórios de ponta, todos sujeitos a rápida obsolescência.
Como estudo de caso, tomemos as três universidades públicas paulistas -USP, Unicamp e Unesp-, cujo orçamento é de cerca de 10% do ICMS recolhido no Estado (quase R$ 7 bilhões em 2009).
Desse montante, 85% são consumidos com a folha de pagamento, restando apenas 15% para todos os outros gastos: construções, compra de materiais, manutenções e pesquisa. Se não fossem as instituições de fomento à pesquisa, como a Fapesp e o CNPQ, praticamente não haveria como financiar a pesquisa nessas universidades.
Nesse cenário, impõe-se um dilema: ou as universidades públicas paulistas se conformam em obsolescer placidamente ou devem procurar outras fontes de financiamento. Daí a importância da parceria público-privada, bem como das doações de mecenas, antigos alunos ou não.
Embora tal aconteça com grande intensidade em outros quadrantes do globo, entre nós não somente inexiste esse costume como ele representa verdadeiro tabu, suficiente para condenar seus próceres às fogueiras da inquisição.
É capcioso o argumento de que a entrada de recursos privados nas universidades públicas compromete a sua autonomia. Trata-se tão somente de tentar manter sua liderança como centros de excelência.
Para tanto, urge que a questão seja pensada sem ideologias, que regras claras sejam delineadas e que seja feito um grande trabalho de conscientização, no sentido de que os antigos alunos de universidades públicas possuem um débito para com elas e, consequentemente, para com a sociedade.
Motivá-los a retribuir a formação que receberam, na medida de suas possibilidades, é salutar e necessário. O modo, emocional e rocambolesco, como foi conduzida a experiência relativa ao projeto de modernização da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco certamente não contribuiu para a referida conscientização.


JOÃO GRANDINO RODAS, 66, é reitor da Universidade de São Paulo. Foi diretor da Faculdade de Direito da USP e presidente do Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica).

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

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