São Paulo, domingo, 10 de agosto de 2008

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ROGÉRIO GENTILE

Medicina paliativa

O DADO é assustador: um em cada quatro médicos do país se forma em cursos "sem condições de funcionamento", segundo a qualificação dada pelo próprio Ministério da Educação para aqueles que obtiveram notas baixíssimas (1 e 2) na última avaliação nacional de desempenho.
Se não têm condições de funcionar, por que foram abertos? E por que não são fechados? São as questões óbvias que o governo federal não consegue responder.
O primeiro curso superior de medicina do país -a Escola de Cirurgia da Bahia- data de fevereiro de 1808, obra de d. João 6º. Foi criado logo após a corte portuguesa fugir para o Brasil. Até 1994, segundo registros oficiais, apenas outros 80 foram abertos, entre instituições públicas (48) e privadas (32).
FHC e Lula, no entanto, acharam que estava na hora de melhorar esses números. Hoje, de acordo com o último censo universitário (2006), o país tem 158 cursos de medicina (88 privados). Ou seja, em 12 anos, eles quase dobraram o que foi feito em 186 anos.
A proliferação dos cursos de medicina -muitos dos quais abertos apesar de pareceres contrários do Conselho Nacional de Saúde- faz parte da política deliberada dos dois presidentes de melhorar artificialmente os índices educacionais do Brasil.
O tucano pegou o país com 5.562 cursos superiores (1,66 milhão de alunos) e entregou com 14.399 cursos (3,47 milhões estudantes).
Com Lula, já são 22.101 cursos (4,67 milhões de matriculados).
O crescimento do número de universitários enche o peito do político e tem também o efeito de agradar aos que ganham muito dinheiro com isso. Sabe quanto custa a mensalidade num desses cursos de medicina "sem condições de funcionar"?: R$ 3.986.
O ônus dessa política fica mais evidente quando se verifica em qual escola se formou o profissional denunciado por erro médico.
Em 2005, o Conselho Regional de Medicina de SP constatou que a taxa de queixa contra médicos formados nos cursos com as piores notas representava mais que o dobro da registrada contra os formados nos cursos bem avaliados.
Certo está o médico Antonio Carlos Lopes, da Sociedade Brasileira de Clínica Médica, quando diz que o ministro da Educação é "bem-intencionado", mas que duvida de que ele terá força para adotar medida dura contra esses cursos de esquina. "É mais fácil cair o ministro do que fechar uma faculdade", disse.
A bem da verdade, o mais provável é que em algum momento seja criado um exame de ordem, nos moldes do que existe para os advogados. Trata-se de uma medida necessária, porque pode salvar vidas.
Mas que punirá apenas o aluno que não passou na prova. As instituições capengas, nas quais esse aluno perdeu tempo e dinheiro, continuarão capengas e... lucrando.


ROGÉRIO GENTILE é editor de Cotidiano.


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