São Paulo, terça-feira, 10 de agosto de 2010

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FERNANDO DE BARROS E SILVA

Cidade da mercadoria

SÃO PAULO - Duas lojas do Santana Parque Shopping foram assaltadas no sábado à noite. Foi o oitavo assalto a shoppings na cidade de São Paulo neste ano. Virou moda.
Ainda que triviais, assaltos sempre são chocantes. Mas o que choca e dá tanto destaque a estes assaltos, em particular, é o fato de terem sido realizados dentro de shoppings. Justamente naquele espaço "protegido", onde as pessoas imaginam estar incólumes, salvas das hostilidades do mundo externo, da violência e dos "intrusos" (como são vistos nesses lugares os pobres).
Escrevendo sobre o fenômeno (mundial, mas muito paulistano), o psicanalista Tales Ab'Saber observou o seguinte: "Sempre que entramos num shopping, sentimos o alívio de estar finalmente em um espaço homogêneo de imagens e direitos. (...) Depois de 40 minutos, estamos exaustos, tamanha a monotonia e pobreza de experiência deste feirão que se quer cidade. Tudo é parecido demais com o ciclo bipolar de uma droga".
Existem em São Paulo 50 shoppings (e outros tantos em construção). Dos "ultrachiques" aos "populares", eles reproduzem a estratificação social dos consumidores -incluem e excluem ao mesmo tempo. Mas, nas suas disparidades, acabam sendo todos muito iguais.
Apartado do espaço público, o shopping é um simulacro de cidade. Mais que um centro de compras, se tornou um complexo de lazer e "vivência", onde há lojas, claro, mas também cafés, praças de alimentação e serviços tão variados como lava-rápido, costureira, podólogo, loteria, academia de ginástica, pet shop, oculista, lotérica, além de cinemas e teatros.
Ainda ontem, por coincidência, o Shopping Cidade Jardim -templo do luxo extremado e alvo de assaltos recentes- fez o coquetel de inauguração do "Espaço do Bem", onde entidades sociais irão vender seus produtos. O nome é tão bom que deveria figurar em qualquer manual de psicanálise, no capítulo dedicado aos "sintomas".


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