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FERNANDO DE BARROS E SILVA
Cidade da mercadoria
SÃO PAULO - Duas lojas do Santana Parque Shopping foram assaltadas no sábado à noite. Foi o oitavo
assalto a shoppings na cidade de
São Paulo neste ano. Virou moda.
Ainda que triviais, assaltos sempre são chocantes. Mas o que choca
e dá tanto destaque a estes assaltos,
em particular, é o fato de terem sido
realizados dentro de shoppings.
Justamente naquele espaço "protegido", onde as pessoas imaginam
estar incólumes, salvas das hostilidades do mundo externo, da violência e dos "intrusos" (como são
vistos nesses lugares os pobres).
Escrevendo sobre o fenômeno
(mundial, mas muito paulistano), o
psicanalista Tales Ab'Saber observou o seguinte: "Sempre que entramos num shopping, sentimos o alívio de estar finalmente em um espaço homogêneo de imagens e direitos. (...) Depois de 40 minutos,
estamos exaustos, tamanha a monotonia e pobreza de experiência
deste feirão que se quer cidade. Tudo é parecido demais com o ciclo bipolar de uma droga".
Existem em São Paulo 50 shoppings (e outros tantos em construção). Dos "ultrachiques" aos "populares", eles reproduzem a estratificação social dos consumidores
-incluem e excluem ao mesmo
tempo. Mas, nas suas disparidades,
acabam sendo todos muito iguais.
Apartado do espaço público, o
shopping é um simulacro de cidade. Mais que um centro de compras, se tornou um complexo de lazer e "vivência", onde há lojas, claro, mas também cafés, praças de
alimentação e serviços tão variados
como lava-rápido, costureira, podólogo, loteria, academia de ginástica, pet shop, oculista, lotérica,
além de cinemas e teatros.
Ainda ontem, por coincidência,
o Shopping Cidade Jardim -templo do luxo extremado e alvo de assaltos recentes- fez o coquetel de
inauguração do "Espaço do Bem",
onde entidades sociais irão vender
seus produtos. O nome é tão bom
que deveria figurar em qualquer
manual de psicanálise, no capítulo
dedicado aos "sintomas".
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