São Paulo, domingo, 10 de setembro de 2006

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A cartada de FHC

Em mensagem ao PSDB, ex-presidente tenta mobilizar seu grupo político no partido já com vistas à sucessão de 2010

NÃO É a primeira vez que uma manifestação do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso causa frenesi na campanha de Geraldo Alckmin. A "carta-manifesto" da quinta-feira foi precedida, em 30 dias, de uma entrevista a uma publicação mensal em que FHC afirmava ser José Serra a pessoa mais preparada para governar o Brasil.
A campanha do ex-governador paulista apenas se iniciava, embora a perspectiva de vitória de Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno já começasse a se expressar nas pesquisas. Na longa e tonitruante "Carta aos eleitores do PSDB", Fernando Henrique volta à carga. No subtexto está a luta de gerações e grupos políticos, interna ao tucanato, que não foi resolvida com a indicação do nome de Alckmin para encabeçar a chapa presidencial.
É evidente o potencial desagregador da intervenção de FHC para a candidatura do ex-governador paulista. Pregar ao futuro do partido, permitir-se criticar com acidez a estratégia eleitoral tucana, denunciar, a esta altura, falhas no encaminhamento da questão Azeredo e na política de segurança pública da gestão Alckmin em São Paulo é como supor que a atual disputa pela Presidência esteja liquidada. É como lançar-se na luta política pela hegemonia no PSDB com vistas à sucessão de 2010.
É verdade que o texto é tão sinuoso, atira para tantos lados, que numa eventual recuperação das chances de Alckmin, se poderá ler nele o germe anímico da reação. Dificilmente, no entanto, essa mais recente cartada de FHC deixará de ser vista, seja qual for o desempenho final do candidato do PSDB em outubro, como mais um torpedo a dinamitar pontes entre pelo menos três grupos políticos na legenda.
Fernando Henrique fala por si, defende o legado de seus oito anos de governo -legado tido como impopular e, pelo jeito, difícil de ser defendido por Alckmin. Mas a carta não é apenas uma tentativa pessoal do ex-presidente de permanecer à tona a partir de 2007. FHC também busca manter a viabilidade da chamada velha guarda tucana nas disputas que se avizinham na sigla. Quem encarna o projeto do ex-presidente é José Serra.
Se as urnas reproduzirem o que hoje dizem as pesquisas, haverá no PSDB dois pólos em condições de disputar a sucessão presidencial daqui a quatro anos: Serra, no governo paulista, e Aécio Neves, no mineiro.
O governador de Minas representa mais que uma aventura pessoal ou um projeto partidário. Seu altíssimo índice de intenções de voto e seu arco de alianças de amplitude ímpar o credenciam como liderança ungida do segundo maior colégio eleitoral. Sua vocação para minimizar inimizades e manter diálogo estreito com Lula -ainda que não o leve a uma improvável aliança com o presidente- abre-lhe o horizonte para um acúmulo de forças de escala nacional.
Aécio Neves parece ser o alvo estratégico de Fernando Henrique. Se a indicação de Serra para o Planalto escapou pelos vãos dos dedos do ex-presidente neste ano, uma derrota semelhante em 2010 estaria muito próxima de sepultar o seu grupo político. Mas tudo muda -e aí está o maior risco da cartada- se Alckmin surpreender e conseguir bater Lula em outubro. As exéquias poderiam ser antecipadas.


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