São Paulo, sábado, 10 de setembro de 2011

Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

Editoriais

editoriais@uol.com.br

Dívida indexada

Para combater anomalia do juro alto, país precisa rever mecanismos públicos e privados que atrelam sua finança à taxa de curto prazo

A indexação de preços, como se sabe, é uma das razões da persistência dos juros altos e da crônica tendência inflacionária brasileira.
O modo de atacá-la é o governo manter a inflação controlada e, conforme esse regime ganhe credibilidade, modificar contratos, eliminando a reposição da inflação passada em favor de regras que tenham mais aderência aos custos dos serviços e ao comportamento dos preços no longo prazo.
Há, entretanto, outra indexação que também determina o juro exorbitante no Brasil. Trata-se do atrelamento à taxa de juros de curtíssimo prazo, comum em toda a regulação financeira do país.
Esse mecanismo começa com a indexação de uma fatia dos papéis da dívida federal aos juros de um dia, medidos pela taxa básica do Banco Central, a Selic. A cada R$ 3 devidos pelo governo, R$ 1 está na forma de Letras Financeiras do Tesouro (LFT), corrigidas pela Selic.
Numa economia tradicional, o BC, ao elevar os juros, deixa relativamente mais pobre quem tinha investido no governo com a taxa de retorno anterior. Essas pessoas e instituições são induzidas a poupar mais e gastar menos para repor a perda financeira. O consumo e o crédito tendem a desacelerar.
No Brasil, quando o BC eleva a Selic no intuito de frear a economia, deixa mais rico um terço dos detentores da dívida federal. Para compensar esse efeito nos outros dois terços, precisa ministrar uma dose maior de juros.
Daí ser boa notícia a disposição recente do governo de reduzir para 5% a parcela de LFTs até 2014. Não será tarefa fácil, contudo. Os aplicadores podem exigir juros ainda maiores para aceitar a troca das LFTs por papéis em que a taxa de retorno do poupador é conhecida e fixada de antemão.
Além disso, apenas eliminar a LFT não basta. É generalizada a cultura do atrelamento de contratos e praxes financeiras à taxa de curtíssimo prazo, herança dos tempos de superinflação. Fundos de investimento comumente permitem aos aplicadores o saque a qualquer hora e se balizam pelo CDI (taxa diária de empréstimo entre bancos, quase igual à Selic).
A regra vale também para os depósitos bancários (como CDBs), outra aplicação muito difundida. Quase a totalidade da poupança financeira nacional tem, na prática, duas características: horizonte de um dia e correção automática pelo CDI. Os resultados são a persistência dos juros altos e o baixo interesse do mercado em financiar investimentos de longo prazo.
Romper essa inércia requer, do governo e do setor privado, mais energia que a dedicada até hoje. Mas é imperioso que essa anomalia seja atacada depressa, porque atrasa a transição do Brasil rumo a uma economia desenvolvida.


Próximo Texto: Editoriais: Um sopro de sucesso

Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.