|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ELIANE CANTANHÊDE
Perguntar não ofende
BRASÍLIA - No segundo bloco do
debate de domingo na TV Bandeirantes, Lula crispou o rosto, começou a ficar vermelho e deu dois passos miúdos para trás. Pensei: ele
não está suportando a pressão, vai
perder as estribeiras.
Mas Lula não partiu para cima de
Alckmin nem soltou palavrões. Foi
em busca de um personagem. Tentou ser agressivo, não funcionou.
Tentou fazer graça por ler as perguntas, não foi engraçado. Tentou
ser irônico, não havia clima. Depois
de quatro anos sem debates e entrevistas, pareceu enferrujado.
O melhor momento de Lula foi
num raro espaço para marcar diferenças de fundo: a política externa.
Sereno, defendeu a ampliação dos
horizontes para a África e a Ásia,
criticou a pressão para esmagar um
país miserável como a Bolívia e concluiu com seu melhor argumento:
as exportações dobraram.
Esse lapso positivo -e destoante
da sua performance em geral-
comprova que não adianta caprichar só na forma nem entupir o telespectador-eleitor com números.
Quando tem resposta, conteúdo,
argumento, Lula convence e vai
bem. Quando não tem, segue o mesmo roteiro: vacila, se irrita, ironiza.
Nem sempre dá certo. "Você pode enganar todos algum tempo, ou
alguns o tempo todo, mas não dá
para enganar todos o tempo todo."
No final, a festa no estúdio foi dos
tucanos, enquanto os petistas
saíam discretamente. A imagem dizia muita coisa sobre as avaliações
das duas campanhas, que pode ou
não coincidir com a avaliação de
quem mais interessa: o eleitorado,
especialmente o indeciso, o que vota nulo ou o que é passível de mudar
de voto, para um lado ou para outro.
O fato é que a estréia demarcou o
território do segundo turno: Lula
tentando trazer FHC para o debate,
e Alckmin insistindo na ética: "De
onde veio o dinheiro do dossiê?"
Sem resposta, Lula se imobiliza e
deixa a dúvida: será que a resposta é
pior do que não tê-la?
elianec@uol.com.br
Texto Anterior: São Paulo - Clóvis Rossi: A assombração Próximo Texto: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Quem ganhou o debate Índice
|