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CLÓVIS ROSSI
Os incorrigíveis
MADRI - Sabe a AIG, a maior seguradora norte-americana, aquela
que o governo teve de socorrer com
uma pilha de US$ 85 bilhões (R$
187 bilhões) para evitar a quebra?
Pois é, apenas seis dias depois desse
socorro, a empresa gastou US$ 443
mil (suficientes para pagar 2.130 salários mínimos) em uma festa para
seus executivos em um dos mais
luxuosos "resorts" da sofisticada
Califórnia.
"Estavam fazendo as unhas das
mãos e dos pés, tratamentos faciais
e massagens, enquanto o contribuinte paga a fatura", esbravejou
Elijah Cummings, que não é nenhuma demagoga esquerdista, mas
uma deputada democrata. Só no
campo de golfe do "resort", deixaram US$ 7 mil.
Sete dos dez principais executivos da AIG participaram da esbórnia. "É uma prática comum nesta
indústria, para compensá-los [aos
executivos] por seu trabalho", disse
o porta-voz da companhia.
Que trabalho, cara-pálida? O de
afundar uma empresa?
O instantâneo, que acabou no
Congresso dos EUA, é talvez um flagrante mais explicativo da crise do
que todo o resto. Não se trata só de
ganância, fator a que muitos atribuem a baderna nos mercados. Que
há ganância, é óbvio. Mas ganância
faz parte da alma do capitalismo e,
em alguns casos, é até combustível
para o progresso (e não tenho aqui
espaço para discutir o conceito de
progresso).
O que essa "prática comum" revela é uma cultura torta, feita de hedonismo ao ponto extremo e de
uma sensação já não de impunidade, mas de inimputabilidade.
Não há respeito não só pelo dinheiro público mas pela própria
empresa que lhes paga salários (os
famosos pára-quedas dourados, expressão que ganhou estado público
com a crise), bônus, luxos. Claro
que ganhar dinheiro não é feio, desde que honestamente.
Mas essa cultura tornou feio não
ter um pára-quedas de ouro.
crossi@uol.com.br
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