São Paulo, quinta-feira, 11 de junho de 2009

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Editoriais

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Identidades em luta

AGRAVARAM-SE os conflitos entre lideranças indígenas e forças policiais na Amazônia peruana. Variam as estimativas quanto ao número de índios mortos no dia 6 de junho. Foram nove, segundo o governo, ou pelo menos 30, na contabilidade das lideranças locais.
No mesmo dia, 25 policiais foram mortos pelos índios -fato que o governo Alan García divulgou em anúncios, carregados de pesado arsenal retórico, nas emissoras de TV.
O conflito se dá em torno de vários decretos presidenciais, datados de 2008, que visavam facilitar a exploração econômica de 60% da Amazônia peruana. As lideranças indígenas, que ontem obtiveram do Congresso a suspensão da vigência do projeto, exigem que leis desse teor sejam submetidas à prévia autorização das comunidades tradicionais que habitam a floresta.
Teoricamente, não se trata de conflito insolúvel. A promoção de atividades que envolvam a população local e a criação de um sistema de compensações -a exemplo do que ocorre com os royalties que beneficiam as regiões produtoras de petróleo- seriam mecanismos capazes de conciliar as necessidades de desenvolvimento do país e a atenção aos interesses indígenas.
O que mais preocupa no contexto latino-americano, todavia, é a crescente confusão entre protesto político e pura afirmação da identidade étnica.
É como se, em sociedades desiguais e divididas, o próprio sentido de um termo como "nação" ficasse esgarçado; populações indígenas constituiriam entidades políticas à parte, e o que se esboça é quase que uma versão sul-americana do famoso -e equivocado- "conflito de civilizações", tematizado pelo teórico conservador norte-americano Samuel Huntington (1927-2008).
Não há "conflito de civilizações", mas conflitos políticos -e derramamentos de sangue. Discordâncias negociáveis -e confrontos homicidas. É diante dessa encruzilhada que lideranças indígenas e o governo conservador do Peru se situam no momento. E aquelas comunidades tradicionais, historicamente alijadas do desenvolvimento do país, precisam ser integradas ao Peru moderno.


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