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FERNANDO RODRIGUES
Renan não é Joseph K.
BRASÍLIA - O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL),
voltou ontem a vestir o figurino de
vítima. Diante de um plenário quase cheio, disse: "Vão ter que botar a
forca lá fora ou a fogueira e pegar o
presidente do Senado lá dentro para queimar". Até aí, está no preço.
O problema veio a seguir. Renan
decidiu repetir uma de suas frases
prediletas: "Não sei do que me acusam". O político alagoano pretende
se comparar tacitamente a Joseph
K. -personagem de Kafka processado sem saber o motivo.
Dentro do Congresso todos sabem perfeitamente quais são as
acusações contra Renan. Para ficar
nas duas principais, ei-las:
1) o presidente do Senado relacionou-se com um lobista da empreiteira Mendes Júnior. Conferia poder ao amigo para transitar com dinheiro vivo a ser entregue como
pensão para uma mulher com
quem Renan tem uma filha;
2) há lacunas inexplicáveis nos
recibos e documentação renanzistas a respeito de atividades no setor
pecuário. As vacas alagoanas aparecem com taxa de fecundidade irreal. A arroba dos bois é vendida pelo maior preço médio do país.
Renan tem, por óbvio, o direito de
se defender. Não há dispositivo legal o compelindo a sair da cadeira
de presidente do Senado. Mas os
outros 80 senadores estão obrigados a responder, com todas as letras, quando o político que os comanda diz não saber do que é acusado. Ontem, todos se calaram.
Nesse momento o cenário guardou alguma similitude com a obra
de Franz Kafka. Renan acabara de
falar sobre forca, fogueira e das acusações inexistentes (sic) contra si.
O plenário, mudo. Tomou a palavra
César Borges (DEM-BA). Falou sobre o rio São Francisco. Inácio Arruda (PC-do-B-CE) discorreu sobre
a pesca de lagostas. Outros temas
vieram. Mas ninguém teve coragem
de listar as acusações contra o presidente da Casa. Patético.
frodriguesbsb@uol.com.br
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