São Paulo, quarta-feira, 11 de julho de 2007

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FERNANDO RODRIGUES

Renan não é Joseph K.

BRASÍLIA - O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), voltou ontem a vestir o figurino de vítima. Diante de um plenário quase cheio, disse: "Vão ter que botar a forca lá fora ou a fogueira e pegar o presidente do Senado lá dentro para queimar". Até aí, está no preço. O problema veio a seguir. Renan decidiu repetir uma de suas frases prediletas: "Não sei do que me acusam". O político alagoano pretende se comparar tacitamente a Joseph K. -personagem de Kafka processado sem saber o motivo.
Dentro do Congresso todos sabem perfeitamente quais são as acusações contra Renan. Para ficar nas duas principais, ei-las: 1) o presidente do Senado relacionou-se com um lobista da empreiteira Mendes Júnior. Conferia poder ao amigo para transitar com dinheiro vivo a ser entregue como pensão para uma mulher com quem Renan tem uma filha;
2) há lacunas inexplicáveis nos recibos e documentação renanzistas a respeito de atividades no setor pecuário. As vacas alagoanas aparecem com taxa de fecundidade irreal. A arroba dos bois é vendida pelo maior preço médio do país.
Renan tem, por óbvio, o direito de se defender. Não há dispositivo legal o compelindo a sair da cadeira de presidente do Senado. Mas os outros 80 senadores estão obrigados a responder, com todas as letras, quando o político que os comanda diz não saber do que é acusado. Ontem, todos se calaram. Nesse momento o cenário guardou alguma similitude com a obra de Franz Kafka. Renan acabara de falar sobre forca, fogueira e das acusações inexistentes (sic) contra si.
O plenário, mudo. Tomou a palavra César Borges (DEM-BA). Falou sobre o rio São Francisco. Inácio Arruda (PC-do-B-CE) discorreu sobre a pesca de lagostas. Outros temas vieram. Mas ninguém teve coragem de listar as acusações contra o presidente da Casa. Patético.

frodriguesbsb@uol.com.br


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