São Paulo, domingo, 11 de julho de 2010

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A vez do Brasil

Nova fase do país justifica a organização da Copa e da Olimpíada, mas os riscos de uso inadequado de recursos públicos são preocupantes

Encerra-se hoje a Copa do Mundo da África do Sul. Caberá ao Brasil receber o torneio em 2014, 64 anos depois de tê-lo patrocinado pela primeira vez. Parece longínquo o país que inaugurou o Maracanã em 1950, com suas imagens fixadas em branco e preto, e os pouco mais de 50 milhões de habitantes -número que já terá superado 200 milhões no ano do Mundial. Foi naquela década contudo que os brasileiros começaram a apresentar-se como aspirantes a um lugar de relevo no mundo.
De 1950 a 1980, a economia nacional cresceu a uma taxa média anual superior a 7% -ritmo que faz lembrar a presente expansão chinesa. Uma capital futurista foi erguida no nada, investiu-se como nunca em infraestrutura, as cidades cresceram, o consumo modernizou-se e as profecias acerca do "país do futuro" pareceram mais próximas de se realizar.
Vieram a seguir tempos de descontrole inflacionário e crises em série, mas o apagado desempenho econômico não impediu que o país saísse da ditadura para consolidar sua jovem democracia.
Desde o Plano Real, criaram-se as condições para a retomada do crescimento, que tem se verificado de maneira convincente.
Nessa nova fase, faz sentido o Brasil, com renovada projeção em fóruns globais, aparecer como patrocinador de uma Copa do Mundo e de uma Olimpíada.
O que não faz sentido é nos arriscarmos a perder a chance de maximizar os benefícios públicos associados a esses eventos, deixando em segundo plano a racionalidade, a lisura e a transparência na gestão dos investimentos.
Quanto a isso, infelizmente, dissemina-se um clima de desconfiança, que já se traduz nas tradicionais anedotas com que se costumam brindar políticos e dirigentes esportivos -não sem motivo- em nosso país.
Até o momento tem-se uma estimativa de gastos públicos federais, com vistas à Copa, da ordem de R$ 22,3 bilhões, o equivalente a quase dois anos do programa Bolsa Família. O montante é o dobro do investido pela África do Sul -e não inclui a construção e reforma de estádios, que, em sua maior parte, se fará com dinheiro de Estados e municípios, além de recursos oferecidos a juros camaradas pelo BNDES.
Tanto na Copa quanto na Olimpíada, o poder público será parceiro de entidades esportivas, como o Comitê Olímpico e a Confederação Brasileira de Futebol, não raro envolvidas em casos suspeitos, cujos dirigentes, que se perpetuam nos cargos, estão longe de poder apresentar resultados sólidos no campo da gestão esportiva no país.
Do ponto de vista econômico, o futebol brasileiro encontra-se em situação crítica, com clubes pendurados em dívidas fiscais e privadas; o esporte olímpico, por sua vez, ainda vive de resultados esporádicos e de uma ou outra modalidade de sucesso.
Para aumentar as preocupações, governo e Congresso tratam de criar medidas para facilitar o desembaraço das licitações e amenizar a fiscalização das obras.
Como o calendário não se moverá, os atrasos, já em cena, apenas conspiram para que recursos públicos sejam consumidos de maneira inadequada, em meio a improvisos e atropelos.
Ainda há tempo para a sociedade exercer pressões e impedir que essas grandes festas esportivas se vejam manchadas pela incúria e pela irresponsabilidade de políticos e aproveitadores.


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