São Paulo, terça-feira, 11 de agosto de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O lixo dos outros e o nosso

CARLOS MINC, ARNALDO JARDIM e PAULO TEIXEIRA


Os fatos repetidos recentemente reforçam a urgência da aprovação de um marco regulatório sobre os resíduos sólidos

SE JÁ não bastassem a expressiva geração de lixo e o fato de não haver um sistema de destinação ambientalmente adequado, privilegiando medidas de minimização indissociáveis de políticas de reciclagem, recuperação e reutilização, o Brasil ainda tem que lidar duramente com um crime ambiental, ou seja, a chegada clandestina de lixo estrangeiro pelos nossos portos.
Chama a atenção o recente episódio de interceptação nos portos brasileiros de centenas de toneladas de diversas classes de resíduos (domiciliares, hospitalares e perigosos) oriundos da Inglaterra que se passavam por materiais recicláveis.
Em 2004, recebemos contêineres com cádmio e chumbo da Itália, da Espanha e dos EUA.
Os fatos repetidos reforçam a urgência da aprovação de um marco regulatório sobre os resíduos sólidos. Nesse sentido, o Congresso Nacional, especificamente, tem uma dívida com a sociedade quanto à elaboração e aprovação das diretrizes para gestão e tratamento adequado dos resíduos.
Contudo, a partir de uma importante iniciativa do Poder Executivo -o envio ao Congresso do projeto de lei nº 1991/07, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos- e da formação de um grupo de trabalho parlamentar -constituído por parlamentares de diferentes partidos-, o debate foi retomado com coesão e intensidade.
O resultado da ação do grupo de trabalho -por meio de audiências públicas, visitas técnicas e diálogos com o governo e com setores da sociedade civil organizada- foi a apresentação pública, em junho passado, de um relatório final indicando as diretrizes e as premissas de uma Política Nacional de Resíduos Sólidos exequível para a realidade brasileira.
Uma visão pioneira que, ao desmembrar o problema do lixo em oportunidades de desenvolvimento de novos negócios e produtos, incentiva processos ecoeficientes, fomenta a inserção social e estabelece o princípio da responsabilidade compartilhada entre a administração pública, o setor produtivo e a sociedade civil organizada.
A proposta em questão insere objetivos, princípios e instrumentos até aqui inéditos, como a análise do ciclo de vida dos produtos, a criação de um sistema de declaração e um inventário nacional de resíduos.
Além disso, gestão compartilhada e integrada, planos de gestão (União, Estados e municípios) e gerenciamento (setor empresarial).
É necessária também a disseminação da educação ambiental, e a inserção de cooperativas de catadores propicia fomento de trabalho e renda.
A previsão e a atenção quanto aos resíduos perigosos, bem como as determinações quanto à proibição expressa de destinações inadequadas e a logística reversa, colocam um fim na possibilidade de importação de lixo, vedando expressamente a importação, ainda que para fins de reutilização ou recuperação. Somente se consentirá a importação de resíduos considerados não danosos ao meio ambiente e à saúde pública, por meio de definição por regulamento.
Um ponto que nos levará ainda a buscar consenso se refere à construção de um modelo viável, com base em instrumentos econômicos e tributários que fomentem processos ecoeficientes e favoreçam a inovação tecnológica, no sentido de diferenciar, do ponto de vista tributário, os equipamentos adequados às boas práticas, às novas oportunidades de negócios, aos ciclos ecoeficientes e à geração de emprego/renda.
Queremos uma Política Nacional de Resíduos Sólidos definitiva, que seja logo aprovada. Ela está delineada no seu fundamento e deverá ser referencial para os Estados e municípios estabelecerem as suas políticas com maior consciência na preservação ambiental.
Assim, propiciaremos mudanças de comportamento, reduziremos a geração de lixo, aumentando a reciclagem, e impulsionaremos a reutilização de produtos que antes pereciam por séculos, contaminando rios, solos e lençóis freáticos.
Com o governo e o Legislativo trabalhando por um tema que interessa às presentes e futuras gerações, não seremos a lixeira de quem quer seja.


CARLOS MINC BAUMFELD , 58, doutor em economia do desenvolvimento pela Universidade de Paris 1, é o ministro do Meio Ambiente.
ARNALDO JARDIM , deputado federal pelo PPS-SP, é coordenador do Grupo de Trabalho Parlamentar para Aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
PAULO TEIXEIRA , deputado federal pelo PT-SP, é membro do Grupo de Trabalho Parlamentar para Aprovação da Política Nacional de Resíduos Sólidos.

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