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Hora da verdade
Decisões do governo na área de política industrial são marcadas por voluntarismo e esbarram na ausência de recursos e de planejamento
Nos últimos dois anos, tornaram-se frequentes as demonstrações de voluntarismo governamental na gestão da economia. Isso é visível especialmente no que
se convenciona chamar de política industrial. Talvez movido por
uma má interpretação das reais
causas da crise financeira de
2008, que teria restaurado a crença no papel dirigista do Estado, o
governo deixou a timidez de lado
e acelerou o que seria uma nova
fase de planejamento estratégico.
São muitos os exemplos de intervenções, em geral justificadas
com discursos sobre a necessidade de apressar o amadurecimento
do "capitalismo brasileiro". Duas
delas refletem com precisão o pensamento econômico que as origina e as restrições práticas que já se
apresentam: a pendente operação
de capitalização da Petrobras no
contexto geral da exploração do
pré-sal e o aporte do Tesouro de
R$ 180 bilhões para o BNDES.
A descoberta do pré-sal alimentou nacionalismo pouco orientado a resultados e levou o governo
a modificar a legislação, em favor
de um novo modelo de partilha
sob comando mais estrito da Petrobras. Em paralelo, foi definido
um plano de investimentos agressivo a ser bancado em grande parte pela própria empresa com recursos que viriam da capitalização. Nesse roteiro, previa-se um
índice de nacionalização da cadeia de fornecimento, que deveria
atingir 65%.
Os aportes no BNDES, por sua
vez, foram originados a partir de
endividamento público e utilizados majoritariamente para financiar grandes empresas, inclusive a
Petrobras. Reportagem da Folha
mostrou que 57% dos recursos ficaram com apenas 12 grupos. É
uma operação de alavancagem,
com riscos para o contribuinte.
O que os dois exemplos têm em
comum? De um lado, a crença na
disponibilidade quase ilimitada
de recursos, que parece reinar no
governo. De outro, a realidade de
escassez que não tarda a se impor.
No caso do pré-sal, está cada
vez mais claro que podem faltar
recursos para os investimentos.
Enquanto não sai a capitalização,
a Petrobras tem buscado empréstimos até na Caixa Econômica Federal, que forneceu R$ 2 bilhões, o
que não é prática usual. E agora
vem à tona que a indústria nacional não tem capacidade de suprir
a demanda, o que pode reduzir o
índice de nacionalização a 35%.
No BNDES o escrutínio da imprensa e de analistas provavelmente impedirá que o Tesouro faça outros aportes, o que implica
que, daqui para a frente, novos
empréstimos estarão sujeitos às limitações de seu balanço patrimonial, como, aliás, manda a boa
prática bancária.
Esses exemplos demonstram
que fazer política industrial é mais
complicado do que parece. Além
de visão estratégica, é indispensável gerir a economia com olhos
voltados para a geração de recursos para investimentos. Tais recursos não podem ser criados com
malabarismos contábeis ou por
decreto. Exigem esforço árduo de
poupança interna, inclusive com
contribuição, por ora ainda inexistente, do setor público.
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