São Paulo, sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

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Paranoia amazônica

Com teses anacrônicas, políticos tentam impedir a adequação da atividade econômica a parâmetros ambientais sustentáveis

A QUALIDADE do debate público em países democráticos pode ser inferida pelo teor das manifestações dos representantes da sociedade no Legislativo. No Brasil, cujo Congresso é ainda lastreado, em grande parte, na influência de oligarquias regionais com traços arcaicos, não surpreende que discussões sobre questões ambientais -tema que veio para ficar na agenda global- se revelem tão medíocres.
A banda parlamentar mais retrógrada, na ausência de argumentos em prol da destruição da natureza, responde com paranoia às tentativas de adequação da atividade econômica a parâmetros compatíveis com a preservação ambiental.
Sobretudo no que toca às modalidades mais intensivas em recursos naturais, como a agricultura, a mineração e a produção de energia, procura-se pintar as agências ambientais e seus aliados como inimigos do desenvolvimento nacional. Na melhor hipótese, seriam inocentes úteis a serviço de ambições externas.
Não é preciso estar na pele de ruralistas antiquados, como tantos no Congresso, para endossar essas teorias conspiratórias. Parlamentares feitos ministros da cota do PMDB, Reinhold Stephanes, da Agricultura, e Edison Lobão, das Minas e Energia, não titubeiam em atacar o Ministério do Meio Ambiente e defender interesses especiais de clientes.
Faz coro com eles o deputado federal Aldo Rebelo (PC do B-SP), que qualificou o MMA como "organização paraestatal" em entrevista à Folha. Para ele, ministério e ONGs estão mancomunados para desfavorecer a agricultura e erguer barreiras aos produtos nacionais.
Rebelo concede que há "degradação no mundo e no Brasil", mas apenas para atacar em seguida: "O que eu estou é destacando que uma parcela do movimento ambientalista é neomalthusiana e neocolonial. Como não existe mais floresta na Europa, escolhe-se um país do Terceiro Mundo para ser uma espécie de jardim botânico europeu, e você submete a população da Amazônia, de camponeses, de caboclos e de ribeirinhos, ao regime de terror".
Retrocede-se, com tais despropósitos e exageros, ao padrão das reações de militares nacionalistas, em décadas passadas, diante das primeiras denúncias internacionais sobre a destruição da Amazônia. Só faltou o deputado reciclar o slogan anticomunista -que em outros tempos se voltava contra ele- e alardear um suposto "perigo verde".
Seria apenas uma manifestação folclórica e reacionária, não fosse Rebelo relator da comissão da Câmara que analisa mudanças no Código Florestal.
É possível e necessário rever o código, para adequá-lo à realidade do agronegócio exportador. A regulamentação pode ser importante para conciliar o crescimento do produto agrícola com um basta à dilapidação do capital natural, por meio do aumento da produtividade. Como se sabe, respeito a normas sustentáveis é um valor em alta no próprio mercado internacional.
Não será com visões maniqueístas e reações paranoicas que se travará um debate racional sobre o tema.


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