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O caso Isabella
Desejo unânime de punir responsáveis por assassinato brutal não pode ser pretexto para execração popular
UMA CRIANÇA é assassinada barbaramente,
em circunstâncias
misteriosas. Seu pai e
sua madrasta atraem as suspeitas da polícia. Decreta-se a prisão
temporária de ambos. No momento em que se entregam à polícia, fotógrafos, repórteres e cinegrafistas estão a postos. A tragédia vai praticamente monopolizando, enquanto isso, os interesses da população.
Quais as responsabilidades da
imprensa em episódios desse tipo? A discussão dificilmente admitirá conclusões rápidas e unívocas. Tende-se, por exemplo, a
julgar em bloco o comportamento da mídia, sem atentar para as
distinções de enfoque entre os
diversos meios de comunicação.
Para as eventuais vítimas de
um prejulgamento popular, entretanto, diferenças desse gênero constituem pormenores de
pouco relevo. O processo que
culmina, muitas vezes, na execração pública tem início antes
mesmo da primeira foto, da primeira entrevista, da primeira
manchete.
A sistemática da investigação
policial no Brasil, especialmente
em casos como o do recente assassinato da menina Isabella
Nardoni, carece de regras mais
rígidas no sentido de limitar os
danos que se abatem sobre a
imagem dos envolvidos.
Quando o pai de Isabella, um
dia após o crime, saía do distrito
policial onde prestara depoimento, uma delegada presente
no local dirigiu-lhe os gritos de
"assassino". A encarregada do inquérito informa à imprensa, numa estranha estatística, que níveis percentuais já atingiu no esclarecimento do caso.
Justificava-se a detenção de
Alexandre Nardoni e de Anna
Carolina Jatobá? Libertados
agora, por determinação judicial
superior, não lhes é devolvida integralmente a condição de serem
considerados inocentes até prova em contrário.
Em muitos casos, a prisão preventiva se justifica: trata-se de
evitar a destruição de provas ou
entraves às investigações policiais. Mas a polícia, que se apressou em pedir a prisão do casal,
demorou três dias para lacrar o
local do crime.
Para além das circunstâncias
específicas do caso, valeria arriscar uma tese mais geral. O malefício social implícito na decisão
de prender um inocente, numa
tragédia familiar desse tipo, é
maior do que o benefício que resultaria, para as investigações, da
prisão de um real culpado.
O assassinato brutal de uma
criança provoca, evidentemente,
um desejo unânime de punição.
Satisfazê-lo com informações
parciais e ações espetaculares
tem um preço -multiplicando a
dor pessoal de possíveis inocentes- que, da polícia à mídia, e ao
próprio público, nem sempre há
disposição para considerar.
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