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TENDÊNCIAS/DEBATES
O Banco Central deveria aumentar os juros na próxima quarta-feira para conter a inflação?
NÃO
Está bom, mas está ruim
JOÃO PAULO DE ALMEIDA MAGALHÃES
QUANDO FOI questionado sobre o crescimento do PIB brasileiro, um economista disse
recentemente: por um lado, está bom,
porque o país cresceu 5,4% e, nos últimos 20 anos, vinha crescendo, na média, menos de 3%; por outro lado, está
ruim, porque, enquanto as economias
emergentes (Índia, China, Rússia, Argentina, e outras) estão crescendo entre 7% e 9%, algumas vezes até 11%, o
Brasil cresceu apenas 5,4%.
Pessoalmente, acredito que a situação brasileira está mais para ruim do
que para boa. Isso porque o crescimento de 5,4% representa não o primeiro passo para uma expansão do
PIB comparável à das demais economias emergentes, mas, sim, uma espécie de teto a não ser ultrapassado.
Vejamos por quê.
O governo atual concede prioridade absoluta à estabilidade de preços
por meio de uma política econômica
baseada no rigoroso cumprimento de
metas de inflação. A maneira de garanti-las consiste em evitar que a demanda global, representada por consumo e investimentos, ultrapasse o
PIB potencial -determinado este,
basicamente, pela quantidade de capital à disposição do país.
O PIB potencial não é constante
-cresce com novos investimentos.
No momento, a taxa de investimentos
sobre o PIB está, no Brasil, em torno
de 18%, o que permite aumento do
PIB potencial no ritmo anual de 5%.
Para que o PIB passe a crescer em
ritmo igual ao das demais economias
emergentes, a porcentagem dos investimentos sobre o PIB deveria ser
de, pelo menos, 21% (nos países asiáticos, essa taxa se acha em 30% ou
mais). Isso nos proporcionaria incremento do PIB de 7% ao ano.
Acontece que, enquanto os investimentos elevam de imediato a demanda global, o aumento do PIB potencial
só ocorre com a maturação dos investimentos. Ou seja, com a entrada em
operação das facilidades criadas, o
que demora de dois a três anos.
A elevação da taxa de investimento
do país de 18% para 21% causará, portanto, inevitavelmente, o aumento
das pressões inflacionárias. Interpretação que, segundo tudo indica, é hoje
aceita pelo Banco Central.
Ou seja, a economia brasileira, com
taxa de investimentos de 18% do PIB,
está calibrada para uma expansão
anual máxima de 5%. Estando a economia, como hoje, perto do seu PIB
potencial, qualquer tentativa de elevar a taxa de investimentos sobre o
PIB gera pressões inflacionárias. Elas
resultam do descompasso entre o aumento da demanda global e a elevação do PIB potencial decorrentes dos
novos investimentos.
Para contê-las, o BC adota medidas
supostamente destinadas a evitar a
inflação, mas cuja eficácia depende de
evitar o aumento da demanda global
decorrente de maiores investimentos. Assim, para todos os efeitos práticos, a taxa de 5% passa a ser o limite
superior para a expansão do PIB.
É por causa disso que alguns analistas vêm afirmando ser o crescimento
de 5% o único compatível com a estabilidade monetária.
Essa visão pessimista é desafiada
pelo anúncio de uma nova política industrial de largo espectro para o país.
Política que, na atual fase do desenvolvimento nacional, constitui a forma correta de acelerar o crescimento.
A nova política industrial, orientada por uma visão estratégica de longo
prazo, abrange 24 setores e tem a capacidade de lançar o Brasil na trilha
do crescimento acelerado. A exemplo
do que aconteceu no país por longo
período no passado e se observa hoje
nas demais economias emergentes.
O problema é que, segundo seus
formuladores, para ser ela levada
adiante, os investimentos do país como porcentagem do PIB devem subir
para 21%, o que entra em choque direto com uma política econômica que
prioriza as metas de inflação.
Para que o Brasil volte, como no
passado, a taxas anuais de crescimento de 7%, é indispensável que as metas de inflação sejam substituídas por
metas de desenvolvimento, com a óbvia adoção concomitante de medidas
destinadas a evitar que as pressões inflacionárias se transformem em inflação aberta. O primeiro passo, contudo, é não subir mais os juros, porque,
assim, o que já não está muito bem vai
ficar ainda pior.
JOÃO PAULO DE ALMEIDA MAGALHÃES, 80, doutor em
ciências econômicas pela Universidade de Paris 1, é presidente do Corecon-RJ (Conselho Regional de Economia do
Rio de Janeiro). É organizador do livro "Economia Brasileira: do Pensamento Único a 25 anos de Semi-Estagnação -
Causas e Solução".
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
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