São Paulo, terça-feira, 12 de abril de 2011

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CARLOS HEITOR CONY

O tempo do tempo

RIO DE JANEIRO - O herói da batalha de Maratona precisou correr 42 quilômetros para transmitir a notícia da vitória numa guerra. Morreu logo após ter cumprido a tarefa. A descoberta (ou o achamento) do Brasil levou mais de dois meses para chegar ao conhecimento do rei Manuel, dito o Venturoso. Hoje, com a internet em funcionamento, Manuel seria venturoso antes do tempo, ficaria sabendo da façanha de Cabral na hora.
A instantaneidade da notícia é uma das conquistas mais fantásticas da humanidade. Cem anos após a Proclamação da nossa República, em 1889, havia brasileiro lá pelo setentrião acreditando que o Brasil ainda era governado por um d. Pedro qualquer, provavelmente d. Pedro 3º ou 4º.
Consta que no Japão, 30 anos depois de Hiroshima, apesar de seu avançado estágio tecnológico, havia soldado do Mikado escondido nas matas pensando que a Segunda Guerra Mundial ainda não acabara. Há poetas que ainda fazem sonetos na ilusão de que serão recitados na Confeitaria Colombo.
Outro dia, a bordo de um avião doméstico, o piloto informou, com voz aveludada e calma, que o tempo estava ótimo em toda a rota. Nem havia comunicado integralmente a boa notícia, o aparelho começou a sacudir como se estivesse com mal de Parkinson.
Quando passou a turbulência, uma das maiores que já atravessei, o piloto explicou que os computadores estavam certos nas duas ocasiões, a do tempo bom e a do tempo ruim. Apenas -disse ele- o tempo fora mais rápido, não dando tempo para que a rede eletrônica de bordo e das estações meteorológicas no caminho pudessem fazer a correção do tempo.
Repeti a palavra "tempo" várias vezes porque acredito que seja o único fato e fator inamovíveis da nossa vida. Não precisa de notícia para existir. O tempo não precisa de tempo para ser tempo.


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