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VINICIUS TORRES FREIRE
Estelionatos e projetos políticos
SÃO PAULO - Na história recente do Brasil, os resultados das eleições se
desdobram em uma curiosa e contraditória síntese de estelionato eleitoral
e cumprimento de programas.
A coisa começa já com o governo
Sarney (1985-90). Na eleição de governadores e do Congresso de 1986,
um plano moribundo, populista e artificial de combate à inflação deu
enorme vitória ao PMDB. Depois das
urnas, o plano foi desmontado sem
pudor. Mas o governo Sarney-Ulysses
continuou populista, tentando encaixar num Orçamento e num crescimento econômico precários favores
antigos da ditadura, novos direitos
sociais e consumo insustentável.
Collor se elegeu com o estelionato
da campanha anticorrupção e dizendo que Lula confiscaria poupanças.
Mas, de modo alucinado, Collor implantou seu programa de abrir e desregulamentar a economia.
É demasiado dizer que o primeiro
FHC se deveu a estelionato, embora a
promessa de equilíbrio fiscal tenha sido esquecida. Mas o segundo FHC se
deveu à ilusão de sobrevida do real
forte. Não se pode, porém, acusar
FHC de não cumprir o plano de "desmontar o Estado varguista".
Lula abjurou a fé petista no final da
campanha, mas a conversão foi súbita demais para convencer consciências decentes e mesmo o PT. Ora promete uma "segunda fase na economia", social e desenvolvimentista,
com o que mitigaria o estelionato
eleitoral. Mas mesmo essa tal "segunda onda" tem algum sabor de FHC 2,
do consenso (ou opinião majoritária)
atucanado sobre políticas públicas,
idéia comum a elites econômicas, intelectuais e políticas.
Se a "segunda onda" vier, Lula
também fará a síntese de 20 anos de
descaminhos e tentativas das políticas públicas no Brasil; tentativas que
sofreram pouca influência de um
movimento popular forte. Foram
mais determinadas pelo mercado,
pelas elites cosmopolitas e pelo desejo
difuso de menos inflação, mais transparência no gasto público e de universalização de um ou outro serviço
público (saúde, educação básica e
impulsos de renda mínima).
Que estranha democracia, essa.
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