UOL




São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 2003

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MARCIO AITH

Anistia da Realpolitik

Está vindo de forma pouco charmosa, mas eficaz, a primeira ação concreta dos petistas para melhorar a economia real do país.
Na ausência absoluta de uma política industrial ou de qualquer outro estímulo à expansão do mercado interno, o governo joga sua força e surpreendente flexibilidade ideológica para aprovar um programa de parcelamento de dívidas tributárias muito mais generoso que os anteriores, aprovados no governo FHC sob oposição de setores petistas.
Batizado de Refis 2, o novo programa já foi aprovado na Câmara e aguarda votação no Senado. Seu texto permite aos contribuintes pagarem em 15 anos dívidas com a Receita Federal e com a Previdência Social. Prevê redução das multas em 50% e suspensão da denúncia criminal para crimes tributários contra empresários que aderirem ao programa.
O Refis de Lula não se parece com o anterior por três diferenças básicas. Os juros são os da TJLP (em vez da Selic), não se exigem garantias para grandes devedores nem a entrega de extratos bancários ao fisco.
Reconhecendo que um dos principais problemas do setor produtivo é a falta de capital de giro das empresas, o projeto de Lula, como foi o de FHC, é abrangente (engloba todos os tributos e situações) e incorpora o conceito da capacidade contributiva (devedoras pagam suas dívidas de acordo com seu faturamento).
De um modo geral, Lula demonstra incrível generosidade com empresários que petistas comparavam a "sonegadores" e responsabilizavam, por exemplo, pelo déficit da Previdência.
Em 2000, enquanto o programa de FHC era finalizado, a equipe da recém-eleita prefeita Marta Suplicy se opunha à "imoralidade" de um similar, em São Paulo, que permitiu o parcelamento de dívidas de tributos municipais.
Não é preciso ir tão longe. Em dezembro passado, o ministro Antonio Palocci Filho sinalizou à revista "Isto É" sua oposição a um novo Refis. Segundo ele, era preferível que empresas pagassem suas dívidas e que o governo deixasse de "estimular um mau comportamento do contribuinte".
Exemplos na Europa e no México mostram que anistias e parcelamentos tributários podem ser eficazes na recuperação da atividade econômica. Apesar disso, são assuntos considerados mundanos por economistas, que preferem analisar conjunturas e acompanhar grandes agregados macroeconômicos.
De fato, o tema envolve aspectos terrenos. Em 2000, advogados do empresário Luiz Estevão tentaram impedir a prisão de seu cliente alegando que, dias antes, ele havia enfiado numa caixa de correio o termo de opção do Grupo OK ao Refis. Estevão era acusado de sonegação fiscal. No mesmo ano, o empresário Baltazar José de Souza, que tinha oito empresas de transporte coletivo em São Paulo e outras 32 no país, usou sua adesão ao Refis para revogar pedido de prisão contra seu filho.
Ao apoiar o Refis 2, o governo aproxima-se da vida real e facilita a vida de empresários, sejam eles responsáveis ou sonegadores contumazes. Faltam agora outras políticas, mais sólidas, para garantir o crescimento e mostrar que a atual administração não é uma versão radical da anterior.


Marcio Aith é editor de Dinheiro. Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de Boris Fausto, que escreve às segundas-feiras nesta coluna.


Texto Anterior: Rio de Janeiro - Carlos Heitor Cony: Dirigismo e oportunismo
Próximo Texto: Frases

Índice

UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.