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TENDÊNCIAS/DEBATES
Nas atuais circunstâncias, é correto manter o
benefício da saída de Dia dos Pais aos presos?
SIM
Pela lei, sem medo nem concessões
JOSÉ GREGORI
O
"SIM" não pode ser uma resposta automática e isolada,
pois se deve encaixar num
contexto que supõe atitudes e medidas imediatas, todas difíceis, mas indispensáveis.
A concessão de 48 ou 72 horas para
estar fora das grades se aplica a presos
devidamente qualificados por exigências expressamente discriminadas
pelo Juizado de Execuções Penais.
Esse benefício -saída temporária-
já existe há alguns anos no Brasil.
Os motivos da justa apreensão da
opinião pública estão ligados à crise
provocada pelos gravíssimos ataques
do crime organizado. Todos estamos
apreensivos, revoltados e ansiando
por providências que nos devolvam a
tranqüilidade. No momento, o Brasil
não enfrenta questão mais séria e grave do que essa.
Não podemos perder a noção de
conjunto e proporções a embasar toda estratégia que vise à superação do
problema. O pré-requisito é que todas
as autoridades se afinem em discurso
e ação. Não é possível que o clima eleitoral absorva os responsáveis quanto
ao que fazer. Não se pode prosseguir
com divergências explícitas quando o
problema exige o esforço de frente
única. Não dá para deixar a questão se
tornar uma espécie de fiel das eleições, uma disputa sagrada em toda
democracia digna desse nome.
Se há quem pense que as ações criminosas favorecem tal ou qual candidato, é preciso dizer que se trata de
uma aberração dos valores democráticos. Mesmo nas disputas mais acirradas, alguns problemas, por sua gravidade, devem ficar blindados contra
as paixões da batalha eleitoral.
Tendo isso em vista, sobre os direitos humanos, consegui estabelecer
com o ministro da área, Paulo Vannuchi, um "Pacto de Defesa dos Direitos
Humanos" (Folha, 30/6), que ficarão
preservados na disputa. A questão da
segurança e do combate à violência,
com maior razão, tem de ser encarada
como prioridade nacional. Não é hora
de balanços recriminatórios, mas sim
de verificar o que deve ser feito e fazer. Sobretudo fazer nas áreas preventiva e coercitiva.
Nesse contexto, na questão prisional, não vejo como o cancelamento do
benefício esperado todo ano possa ser
uma medida construtiva.
É fundamental que se compreenda
que nem todos os 140 mil presos de
São Paulo (ou 400 mil no Brasil) são
da organização criminosa. Quando do
auge da crise sangrenta de maio, 70%
dos presídios paulistas ficaram fora
do motim e da rebelião.
Depois disso, reitero, o benefício da
saída temporária pode ser rigorosamente condicionado como o Judiciário entender. Interessa a toda a sociedade, por meio de ajustes, melhorar, e
não piorar a conduta dos presos. A seleção deverá ser rigorosa para excluir
a possibilidade de beneficiar quem se
aproveite da saída para delinqüir, beneficiando só os presos de bom comportamento, já em regime de semiliberdade e sem antecedentes de ligação com organizações criminosas.
O Brasil deve convencer-se de que
os Poderes constituídos, os governos
e a sociedade não vão tolerar nem
condescender com o crime organizado, que merece repúdio, indignação e
combate. E acreditar numa política
carcerária que incentive a recuperação, tratando quem se ajusta à lei de
forma diferenciada de quem se insubordina. Fazer justiça é exatamente
diferenciar. O maior inimigo dos direitos humanos é a impunidade.
Quando ministro da Justiça, sugeri
ao presidente da República o indulto
de Natal severo que beneficiava apenas quem já apresentava mostras de
ter absorvido a dura lição da perda da
liberdade. Alguns, infelizmente, voltaram ao crime, mas outros, muitos
outros, não reincidiram e se tornaram cidadãos prestantes.
Não se pode perder esse equilíbrio
entre a punição nas formas da lei e a
esperança de refazer vidas. Sei que é
uma missão complexa. Na luta incansável contra o crime organizado, não
podemos capitular nem subestimar a
capacidade do Judiciário de conceder
um benefício criteriosamente e executá-lo sem perda de controle. Há riscos? Há, mas, a meu ver, o maior risco
seria conceder à máfia brasileira o argumento de que já está conseguindo
fazer com que a sociedade brasileira,
por causa dela, tema cumprir a lei.
JOSÉ GREGORI , 75, advogado, é presidente da Comissão
Municipal de Diretos Humanos de São Paulo. Foi ministro
da Justiça e secretário Nacional de Direitos Humanos.
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