São Paulo, sexta-feira, 12 de agosto de 2011

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Reino desunido

A explosão de violência em várias cidades britânicas, deflagrada após a morte de um homem pela polícia na periferia de Londres, põe o primeiro-ministro David Cameron na berlinda mais uma vez.
Depois de eleito, em 2010, Cameron nomeou assessor um dos principais envolvidos no caso de escutas ilegais do jornal tabloide "News of the World". A revelação da extensão dos malfeitos, no mês passado, causou o fechamento do jornal e levou a crise ao nº 10 de Downing Street, sede do governo.
Agora o premiê, assim como a polícia, demorou a se dar conta de que uma manifestação contra a alegada violência policial degenerava numa espiral de saques, incêndios e vandalismo. Cameron cancelou suas férias e voltou ao Reino Unido só na terça-feira, quando os quebra-quebras já ultrapassavam os limites da capital.
A origem dos distúrbios, os piores em 30 anos, ainda não está clara. A resposta deve estar numa combinação -com proporções desconhecidas- de fatores como gangues de vândalos e criminosos, exclusão social, tensões entre grupos étnicos e efeitos dos cortes de gastos sociais do governo.
O componente racial parece menos saliente que em distúrbios anteriores, como os do bairro londrino de Brixton em 1981, quando os protagonistas eram predominantemente negros. Da violência atual participam tanto brancos quanto negros e asiáticos.
Subjaz, sem dúvida, um componente socioeconômico. O Reino Unido foi um dos países mais atingidos pela crise de 2008. Teve a maior recessão em três décadas e um recuo de 4,9% do PIB em 2009; o último trimestre de 2010 registrou retração e, neste ano, a previsão de crescimento foi rebaixada de 1,8% ao ano para 1,4%.
O desemprego entre os jovens, quase sempre os atingidos com mais severidade, passa de 25%.
Cameron elegeu-se como um conservador moderno, com uma proposta de "Grande Sociedade" que previa menos intervenção estatal na vida das pessoas e mais engajamento das comunidades.
Diante dos tumultos, anunciou medidas extremas para o contexto britânico, como uso de balas de borracha e possíveis restrições às redes sociais para impedir mobilizações. Definiu o combate a gangues como prioridade e disse que a "falsa preocupação com direitos humanos" não vai impedir que se levem criminosos à Justiça.
O público britânico deve apoiar tal endurecimento, pois há grande consenso contra o vandalismo. Sem perspectiva real de melhora nas condições sociais, todavia, Cameron enfrentará dificuldades para recompor o capital político.


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