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Reino desunido
A explosão de violência em várias cidades britânicas, deflagrada após a morte de um homem pela polícia na periferia de Londres,
põe o primeiro-ministro David Cameron na berlinda mais uma vez.
Depois de eleito, em 2010, Cameron nomeou assessor um dos
principais envolvidos no caso de
escutas ilegais do jornal tabloide
"News of the World". A revelação
da extensão dos malfeitos, no mês
passado, causou o fechamento do
jornal e levou a crise ao nº 10 de
Downing Street, sede do governo.
Agora o premiê, assim como a
polícia, demorou a se dar conta de
que uma manifestação contra a
alegada violência policial degenerava numa espiral de saques, incêndios e vandalismo. Cameron
cancelou suas férias e voltou ao
Reino Unido só na terça-feira,
quando os quebra-quebras já ultrapassavam os limites da capital.
A origem dos distúrbios, os piores em 30 anos, ainda não está clara. A resposta deve estar numa
combinação -com proporções
desconhecidas- de fatores como
gangues de vândalos e criminosos, exclusão social, tensões entre
grupos étnicos e efeitos dos cortes
de gastos sociais do governo.
O componente racial parece
menos saliente que em distúrbios
anteriores, como os do bairro londrino de Brixton em 1981, quando
os protagonistas eram predominantemente negros. Da violência
atual participam tanto brancos
quanto negros e asiáticos.
Subjaz, sem dúvida, um componente socioeconômico. O Reino
Unido foi um dos países mais atingidos pela crise de 2008. Teve a
maior recessão em três décadas e
um recuo de 4,9% do PIB em
2009; o último trimestre de 2010
registrou retração e, neste ano, a
previsão de crescimento foi rebaixada de 1,8% ao ano para 1,4%.
O desemprego entre os jovens,
quase sempre os atingidos com
mais severidade, passa de 25%.
Cameron elegeu-se como um
conservador moderno, com uma
proposta de "Grande Sociedade"
que previa menos intervenção estatal na vida das pessoas e mais
engajamento das comunidades.
Diante dos tumultos, anunciou
medidas extremas para o contexto
britânico, como uso de balas de
borracha e possíveis restrições às
redes sociais para impedir mobilizações. Definiu o combate a gangues como prioridade e disse que
a "falsa preocupação com direitos
humanos" não vai impedir que se
levem criminosos à Justiça.
O público britânico deve apoiar
tal endurecimento, pois há grande
consenso contra o vandalismo.
Sem perspectiva real de melhora
nas condições sociais, todavia,
Cameron enfrentará dificuldades
para recompor o capital político.
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