São Paulo, quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

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ANTONIO DELFIM NETTO

Segurança nacional?

UMA DAS idéias mais sedutoras disseminada pelo corporativismo que se apropriou do Estado e reforçou a sua posição com poderosa organização política é sugerir que há setores tão fundamentais para a vida do cidadão (educação, saúde, energia, transporte etc.) que deveriam ser considerados como de "segurança nacional".
Em outras palavras, devem continuar na forma de monopólio do Estado que eles controlam.
Angustiado pela "ameaça" de ficar na dependência de empresários nacionais ("que olham apenas o maior lucro") ou sob o terror de depender de empresários estrangeiros ("que além de desejarem o maior lucro ainda ignoram o interesse nacional"), o pobre cidadão é presa fácil dessa pregação. Não se trata de um fenômeno apenas brasileiro, mas aqui tem características próprias. É apoiado: a) por parte da Igreja Católica e b) pela autêntica jabuticaba nacional que são as Organizações Não-Governamentais (as ONGs) multiplicadas e financiadas pelo próprio Estado-corporativista para sustentá-lo.
Esse uso do "interesse nacional" banalizou um conceito que só faz sentido quando se opõem os interesses da nação com relação às outras. Toda nação tenta organizar-se na busca de três autonomias: a alimentar, a energética e a militar. O fato é que essas três autonomias são tão mais bem servidas quanto mais eficiente for o sistema produtivo. Exatamente o que a história mostrou que o Estado-produtor é incapaz de fazer.
Também para os outros objetivos da sociedade (mais justiça, maior igualdade de oportunidades), o que interessa é a eficiência produtiva. É ela que pode permitir ao mesmo tempo mais crescimento econômico e maior transferência distributiva. Para isso a natureza da propriedade (pública ou privada) ou a sua identidade (nacional ou estrangeira) são irrelevantes.
Apenas para dar um exemplo, lembremos o que dispôs o artigo 1º do decreto-lei nº 4.750, editado em 28 de setembro de 1942, que criou a Coordenação da Mobilização Econômica depois que o Brasil declarou guerra ao Eixo (22/8/1942): "Art. 1º - Ficam mobilizadas, a serviço do Brasil (sic), todas as utilidades e recursos econômicos existentes no território nacional, seja qual for a sua origem, caráter, propriedade ou vínculo de subordinação.
Parágrafo único. Inclui-se na mobilização o trabalho humano" (sic).
A nossa própria história mostra que, no caso de real "segurança nacional", o Estado pode dispor de tudo (nacional ou estrangeiro) o que está no território sob seu controle. Logo, ela não pode ser argumento válido para o corporativismo continuar a viver à custa do cidadão distraído...


contatodelfimnetto@uol.com.br

ANTONIO DELFIM NETTO
escreve às quartas-feiras nesta coluna.


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