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Campanha biônica
Lula se prevalece da legislação eleitoral e antecipa corrida sucessória com ministra que tirou do anonimato
DO POWER Point ao pagode, vai de vento em
popa o mutirão que
tenta popularizar a
imagem da chefe da Casa Civil,
Dilma Rousseff. Sairá candidata
à sucessão de Lula? "Deixa a vida
me levar", cantarolou a ministra
na saída de mais um evento preparado para alçá-la ao estrelato.
As aulas de lulismo produzem
outros efeitos. Rousseff conseguiu deixar de lado o soporífero
slide show do PAC e falou de improviso a milhares de prefeitos
especialmente reunidos em Brasília. O programa federal de
obras ganhou até alegoria pecuária. O PAC é "uma vaquinha" que
"está ficando bem gordinha",
metaforizou a petista.
Como traquejo e manemolência não se assimilam com facilidade, o resultado parcial soa bizarro. Afinal, nesse projeto sucessório acalentado pelo presidente Lula, o estranhamento não
transparece apenas no contraste
entre a sisudez tecnocrática da
ministra e o figurino macunaímico que tenta vestir.
Não é comum que um presidente da República se ponha a
inventar um candidato para sucedê-lo. Se "política tem fila", como diz o clichê, Lula deu a famosa carteirada e de uma só tacada
arrancou Dilma Rousseff do bolso do colete, do anonimato e da
inexperiência político-eleitoral.
A fila do Partido dos Trabalhadores, conceda-se, parecia mais
um cordão de fuzilados após o
escândalo do mensalão. Este, por
sinal, foi o lance que determinou
as condições do jogo atual: Lula
sobreviveu e se fortaleceu; o PT
se descaracterizou e se submeteu ao ditado presidencial; Dilma
Rousseff substituiu José Dirceu,
caído em desgraça.
A transformação de Lula num
aiatolá petista, um caudilho que
impõe sua vontade e é adulado
por isso, não deixa de funcionar
como golpe de misericórdia na
imagem de uma sigla que gostava
de se identificar como a única organização partidária digna do
conceito no país. O PT resignou-se a louvar Lula e aparelhar a máquina pública.
Os rasgos cesaristas, entretanto, não ficam restritos à relação
entre Lula e seu partido. Inebriado em popularidade, o presidente movimenta seu arsenal numa
direção preocupante. Enquanto
brinca de atacar e depois afagar
os meios de comunicação, se
acha no direito de decidir, ao arrepio da previsão legal e da responsabilidade do cargo, quando
e em que condições dar início à
campanha eleitoral de 2010.
Dilma Rousseff é exposta à
exaustão em palanques pelo Brasil afora, em atividades que notoriamente vão muito além de suas
atribuições de ministra. Beneficia-se, sozinha, da tutela excessiva da legislação eleitoral, que impede outros potenciais candidatos de fazerem campanha até
meados do ano que vem.
Antecipar, nessas condições, a
corrida sucessória da candidata
biônica do presidente Lula pode
parecer, para alguns, um lance de
rematada esperteza. Mas é péssimo num país que precisa de tranquilidade, institucional e política, para enfrentar uma gigantesca crise internacional.
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