São Paulo, sábado, 13 de fevereiro de 2010

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Editoriais

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Do palácio à prisão

Convergem, no caso Arruda, a estrita lógica jurídica e o clamor da opinião pública cansada de tanta impunidade

FOI DEMAIS. A prisão do governador do DF, José Roberto Arruda, vem demonstrar que, mesmo num país onde a corrupção política assume proporções de pandemia, há limites para a contumácia e a desfaçatez.
Negando o pedido de habeas-corpus encaminhado pela defesa, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, mantém Arruda recolhido nas dependências da Polícia Federal, conforme havia sido determinado pelo plenário do Superior Tribunal de Justiça. Só depois do Carnaval a decisão de Marco Aurélio Mello será ratificada, ou não, pelos seus colegas do Supremo Tribunal Federal.
Qualquer que venha a ser o veredicto dos ministros do STF, o episódio se caracteriza pelo ineditismo. Levado do palácio à prisão, um governador eleito pelo voto popular, contando com poderoso e aparentemente inexpugnável esquema de sustentação no Legislativo, vê quebrarem-se, pela ação pronta da Justiça, suas expectativas de continuar afrontando os cidadãos.
Não é comum verificar-se tamanha convergência entre o clamor da opinião pública e a análise técnica que deve embasar qualquer decisão do Judiciário.
A prisão preventiva de Arruda não se fundamentou, cabe lembrar, nas evidências de corrupção que se explicitaram com os primeiros vídeos da operação Caixa de Pandora. Surgiu, na verdade, de outra circunstância, que se poderia até chamar de um acidente de percurso -a saber, os fortes indícios de que o governador tentava corromper testemunhas e impedir o andamento das investigações a seu respeito.
Um novo vídeo, mostrando os contatos entre um emissário de Arruda e uma testemunha do inquérito, proporcionou evidência suficiente para que o governador do DF perdesse o direito de acompanhar as investigações em liberdade. A isto se acrescentou o argumento, sem dúvida mais conjetural, de que sua permanência no cargo traria ameaça à ordem pública.
Deve-se admitir que o descrédito de Arruda não se traduziu, talvez até por cansaço e desalento da opinião pública, em mobilizações populares proporcionais à dimensão de todo o escândalo.
Do ponto de vista institucional, a norma da separação dos Poderes oferecia ao governador possibilidades de impedir, graças à sua bancada parlamentar, a abertura de um processo.
Por incrível que pareça, não estava excluída a perspectiva de que José Roberto Arruda se mantivesse, como tantos outros, a salvo de qualquer julgamento.
Só se pode atribuir a uma excessiva, quase patológica confiança na inação da Justiça, o fato de Arruda ter oferecido uma ocasião para prendê-lo.
Se o fato traz inegável satisfação a uma sociedade exausta de impunidade, deve-se levar em conta que, pelo próprio ineditismo, a prisão se configura mais como uma exceção do que como o início de uma nova etapa na política do país. Mas sinaliza, ao menos, que não se pode ir tão longe quanto ele em matéria de acinte à população.


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