São Paulo, terça-feira, 13 de março de 2007

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ROBERTO MANGABEIRA UNGER

Crescer sem dogma

PARA QUE se aprofunde o crescimento econômico com inclusão social, os ajustes do juro e do câmbio são condições necessárias, porém não suficientes.
Estão ligadas as duas condições: a pressão baixista sobre o juro aliviaria em muito a pressão altista sobre o câmbio.
E já há até amplo grau de consenso a respeito das outras iniciativas imprescindíveis ao tipo de desenvolvimento que o país deseja. Essas iniciativas terão de ocorrer em cinco grandes áreas. A primeira, e a mais importante, é a melhora da qualidade do ensino básico. A segunda é a ampliação de nossa base de energia e de transporte. A terceira é simplificação tributária que culmine na desoneração da folha de salários e que, com isso, ajude a tirar da informalidade mais da metade de nossos trabalhadores. A quarta é a reconstrução do Estado: de seus quadros e de suas práticas de gestão. A quinta é o uso dos poderes e dos recursos do Estado para facilitar o acesso à tecnologia, ao crédito e ao conhecimento por parte do empreendedorismo que emerge de baixo em todo o país.
Para que tais iniciativas tenham como desfecho o crescimento com inclusão, terão elas de vir precedidas de correção mais dramática do juro e do câmbio do que a conseguida até agora? Ou podem os ajustes do juro e do câmbio ocorrer mais tarde, no meio do caminho, sem prejuízo para o alvo maior?
Estou entre os muitos que defendem a correção já. Discordo da idéia de que juro mais baixo e câmbio menos valorizado sejam impossíveis, dentro do respeito aos contratos da dívida e do regime do câmbio flutuante, sem que o país tenha de fazer sacrifício fiscal ainda maior do que o que já faz. Desarmemos, contudo, os espíritos e avaliemos a outra opção: a de esperar, pacientemente, que os cinco conjuntos de iniciativas desenvolvimentistas não só comecem a acelerar o crescimento includente como também facilitem, em etapa posterior, os ajustes do juro e do câmbio.
Obriga-me a honestidade intelectual a reconhecer que essa segunda opção goza de duas vantagens enormes. Minimiza o risco de reação desestabilizadora por parte dos mercados. Em parte por causa disso, mas também por conta de sua aparência de moderação e de normalidade, facilita construir em torno da causa desenvolvimentista um consenso nacional abrangente e duradouro. Sem tal consenso, não chegaremos lá.
Portanto, abaixo os dogmas -não só os deles mas também os nossos. É mais importante dar braços e asas à energia frustrada da nação do que homenagear nossas teses.

www.robertounger.net


ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.


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