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MARCOS NOBRE
O lugar dos conservadores
A segunda metade do já distante século 20 não foi tempo
de sutilezas políticas. A Guerra Fria entre os EUA e a então
União Soviética bloqueava a
política como só guerras conseguem.
Se não declarasse adesão a
um dos polos, uma pessoa tinha de passar por extenso formulário de antecedentes para
poder enunciar sua posição.
Para evitar toda essa burocracia política, o questionário
básico passou a conter apenas
três categorias: "conservador", "reacionário" e "progressista". No formulário, a alternativa "nenhuma das anteriores" costumava ser preenchida com "alienado".
É possível que, da classificação, somente os "reacionários" tenham conseguido sobreviver sem muitos sobressaltos. Com razão, já que estão
sempre no mesmo lugar.
Progresso foi uma das
ideias mais criticadas no século 20. E por boas razões. Mas,
sem alarde, a referência ficou
na política. "Progressista" designava quem se pautava pela
necessidade de transformação
social em algum nível. E não
apenas por progresso tecnológico ou material.
"Conservador" incluía desde defensores de ditaduras até
liberais civilizados, comprometidos com instituições democráticas mínimas. O campo
conservador se caracterizava
por estabelecer limitações prévias e fixas contra tentativas
de transformação social substantivas.
As últimas três décadas colocaram essas categorias de
ponta-cabeça. Como os progressistas conseguiram institucionalizar várias de suas
bandeiras, os conservadores tiveram de sair da inércia e ir à luta.
E, a cada batalha que venciam, os progressistas se recolhiam a uma posição meramente defensiva das instituições que ajudaram a criar.
Não por acaso, a vaga conservadora veio junto com a autoajuda. Se só você mesmo pode se ajudar, qualquer proteção que venha de fora é necessariamente má e perversa.
O problema é que isso não
funciona em tempos de crise
econômica global. Nessa hora, o indivíduo precisa mesmo
é da solidariedade social consubstanciada nas políticas sociais protetivas instituídas pelo progressismo.
Só que as vitórias conservadoras bloquearam objetivamente o funcionamento dessas políticas.
Sem substitutos à vista, são
dois campos políticos igualmente obsoletos. Mas que
continuam a operar. E com a
importante diferença de que o
conservadorismo está no poder. Nas instituições e nos livros de autoajuda.
E, para se manter no poder,
tem a cara dura de aceitar sem
corar todas as políticas que
malhou nos últimos 30 anos.
Vai ganhando por inércia. O conservadorismo voltou a seu lugar natural.
nobre.a2@uol.com.br
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