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Deserto moral
Nova moratória nas regras do Código Florestal incentiva desmate, assim como as anistias fiscais estimulam sonegação
POLÍTICAS públicas no Brasil parecem pautar-se pela subversão completa do
adágio alemão: por aqui,
confiança é bom, mas descontrole é melhor. Sacrifica-se a segurança jurídica pela disseminação
do risco moral, que bonifica o
descumpridor de normas com
anistias, descontos e moratórias.
Desta feita são os desmatadores ilegais que escapam ao peso
da legislação. É o mesmo padrão
abraçado pelo Congresso em
abril, quando modificou medida
provisória para prodigalizar facilidades a todo e qualquer devedor da Receita. Nada a estranhar
numa nação em que o próprio
Executivo protela pagamentos
devidos, mesmo condenado pela
Justiça, como atesta a proliferação dos precatórios.
O particular, diante de tanta leniência, se vê incentivado a sonegar impostos e desonrar compromissos. Assim se passa com o
cumprimento das obrigações
ambientais estipuladas pelo Código Florestal. Transformou-se
em queda de braço entre proprietários e o Ministério do Meio
Ambiente, sob o coro ruidoso da
bancada ruralista no Congresso.
O código determina desde
1965 que donos de terras estão
obrigados a manter intactas
áreas de reserva legal (hoje, 20%
a 80% da propriedade, conforme
a região) e de proteção permanente (como topos de morro e
margens de corpos d'água). Em
teoria, deveriam averbar -fazer
anotar em escritura- os limites
dos terrenos a preservar. Na prática, é raro o proprietário que se
arrisca a reconhecer o passivo
ambiental.
Em junho de 2008, o governo
federal decidiu endurecer. Em
seis meses, todos deveriam fazer
a averbação e adotar planos de
recuperação de áreas desmatadas ilegalmente, sob a ameaça de
receber multas milionárias. Um
dia antes de vencido, o prazo foi
prorrogado por um ano.
O novo prazo chegou anteontem. Mais uma vez, o governo cedeu na véspera de sua expiração
e o estendeu -por três anos. Não
contente em assim premiar a
maioria que resistia à norma,
agregou ao pacote generoso a
suspensão de todas as multas já
aplicadas para quem aderir, excetuando apenas as autuações
com julgamento definitivo na esfera administrativa.
Os donos de terras que fizerem
a averbação correm o risco de
descobrir-se tão ludibriados
quanto os contribuintes que pagam seus impostos em dia. A
conclusão racional que extrairão
de mais esse episódio será que
vale a pena procrastinar e aguardar o prometido abrandamento
das normas do Código Florestal.
São coisas diversas. O código
merece revisão, como já se defendeu aqui, nos pontos em que
se distancia da realidade agropecuária consagrada por séculos de
ocupação. Quem desmatou na
vigência do código, porém, deve
sentir o peso das consequências
-ou este país se transformará
num deserto de árvores e de leis.
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