São Paulo, Quinta-feira, 14 de Janeiro de 1999
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Agência Nacional do Petróleo, primeiro ano


Se o primeiro ano foi de muito trabalho, o futuro certamente reserva à ANP novos grandes desafios


DAVID ZYLBERSZTAJN

A Agência Nacional do Petróleo (ANP) completa hoje um ano de existência. Nesse primeiro período, a agência enfrentou a difícil tarefa de pôr em marcha o novo modelo de participação do Estado no setor de petróleo, estabelecendo regras que possam propiciar o surgimento de um mercado competitivo, no qual estejam garantidos os direitos do cidadão, a proteção do meio ambiente e a promoção do desenvolvimento econômico.
Para avaliar as dimensões das responsabilidades e desafios da agência, cabe lembrar que o Brasil encontra-se entre os 20 maiores produtores de petróleo e entre os dez países com maior capacidade instalada de refino do mundo todo. O faturamento anual das empresas do setor atinge cerca de US$ 50 bilhões, gerando 200 mil empregos. Portanto a abertura de um setor de tamanha dimensão envolve uma regulação complexa, centenas de contratos de concessão e uma fiscalização de várias dezenas de milhares de agentes econômicos.
É, assim, uma satisfação verificar que a ANP está em pleno funcionamento, com seus órgãos estruturados, com seus processos definidos e com pessoal disponível e qualificado para uma operação enxuta e eficiente.
Entre todas as conquistas obtidas nesse primeiro ano, três mostram de maneira clara a transição do modelo de monopólio para as práticas de mercado. A primeira foi a formalização dos direitos da Petrobrás, separando o governo da empresa sem afetar a continuidade de suas operações, sem prejuízos aos investimentos ou ao consumidor. A segunda foi a liberação, depois de 45 anos, da importação de gás natural e petróleo. A terceira, a autorização para construção de uma refinaria no Ceará.
Da mesma forma, pode ser considerada um sucesso a atração de dezenas de empresas internacionais que instalaram escritórios no país e que passaram a se interessar pelos projetos oferecidos em parceria pela Petrobrás. No abastecimento de combustíveis, duas distribuidoras de grande porte entraram no mercado brasileiro.
Vale, ainda, destacar o imenso esforço da ANP na fiscalização e no controle da distribuição e da revenda, que já resultou em sucessos significativos no sentido da redução das práticas desleais de mercado e das adulterações de produtos.
Ao mesmo tempo em que cuidava das atividades do dia-a-dia, a ANP começou a se preparar para o futuro, tomando providências para a licitação de novas áreas de exploração -cujas regras estarão sendo divulgadas ao mercado hoje, em seminário no Rio de Janeiro-, contratando projeto para a implantação de um novo modelo para o abastecimento nacional, realizando estudos para a liberação das importações dos derivados de petróleo e para o desenvolvimento do setor de bens e serviços nacional no petróleo, entre tantos outros projetos.
Se o primeiro ano foi de muito trabalho, o futuro certamente reserva à ANP novos grandes desafios. Nas atividades de exploração e de produção, a atração de investimentos e de tecnologia. No transporte, a expansão da infra-estrutura existente, como forma de reduzir os custos de recebimento, estocagem e transferência de petróleo, gás e produtos refinados.
No refino, o objetivo é a desconcentração do setor, viabilizando a construção de novas unidades e a expansão das refinarias de Manguinhos e Ipiranga. No abastecimento, as práticas desleais de mercado e as adulterações de produtos continuarão sendo uma preocupação permanente. Novas rotinas de fiscalização serão introduzidas, envolvendo a reestruturação da atividade, treinamento de pessoal, planejamento de campanhas-relâmpago e a adição de marcadores e corantes aos combustíveis, o que permitirá identificar e comprovar fraudes que atentam contra os direitos do consumidor.
Não menos importante é a liberação das importações dos derivados básicos, de forma a introduzir novas alternativas de suprimento aos agentes do abastecimento. No setor de gás natural, a agência deverá preocupar-se com a elaboração de uma regulação que estabeleça condições reais para a entrada de novos agentes e que, ao mesmo tempo, iniba práticas monopolistas.
Mais do que tudo, a criação de regras estáveis e a conquista da confiança dos agentes são vitais para o sucesso do novo modelo. A confiança dos investidores internacionais, que contam com opções alternativas em muitos países; a confiança dos consumidores, num momento em que os preços do petróleo encontram-se num patamar baixo; a confiança das empresas aqui instaladas, sejam as companhias de petróleo, sejam os fornecedores de bens e serviços, que, afinal, geram empregos.


David Zylbersztajn, 44, engenheiro mecânico e doutor em economia da energia pelo Institut d'Economie et de Politique de L'Energie de Grenoble (França), é diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP). Foi secretário de Energia do Estado de São Paulo (1995-1998).



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