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Aventura em Teerã
Brasil deveria abandonar o papel de advogado de defesa do atual governo iraniano e cancelar a visita de Lula ao país
NO MOMENTO em que
EUA e Irã acirram o
embate em torno do
programa nuclear do
país persa, nada obriga o Brasil a
alinhamentos automáticos.
Ao mesmo tempo em que é razoável duvidar da eficácia das
sanções ora defendidas pelos
norte-americanos, cumpre romper com o papel de advogado de
defesa do autoritário governo
iraniano -função que o país parece querer desempenhar desde
a reeleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad, em junho
do ano passado.
Dentro do quadro que se configura, seria prudente suspender a
viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Irã, programada para maio, como contrapartida à vinda do mandatário
iraniano ao Brasil, em 2009.
Razões pragmáticas e de princípios se unem para tornar recomendável o cancelamento. Sob
violenta repressão policial, milhares de iranianos têm se manifestado contra as restrições aos
direitos civis impostas pelo regime dos aiatolás.
Em resposta, a teocracia islâmica condena opositores à morte. Não faz sentido o Brasil apressar-se em ser compreensivo com
um governo que enforca dissidentes. Foi isso o que fez, no entanto, logo após a controversa
eleição de Ahmadinejad.
Não bastassem as circunstâncias políticas, agravam-se os confrontos relativos ao desenvolvimento de tecnologia nuclear pela república islâmica. As declarações do governo local a esse respeito não podem ser divorciadas
da lógica da política interna do
país. É recurso conhecido de regimes autoritários, ou que enfrentem crise de legitimidade, a
tentativa de galvanizar o apoio
da população em torno de algum
projeto nacional, ao mesmo tempo em que se demonizam as críticas vindas do exterior.
O domínio do processo de
enriquecimento do urânio é um
projeto antigo dos iranianos, que
afirmam persegui-lo apenas para
uso energético e em tratamentos
medicinais. O país, entretanto,
dificulta a fiscalização da Agência Internacional de Energia
Atômica e recusou, tal como
apresentada, a proposta de EUA,
França e outros países ocidentais de realizar o processamento
do urânio no exterior.
Daí o desejo dos EUA de impor
sanções. É razoável, em contrapartida, o argumento do chanceler Celso Amorim de que medidas que afetem a economia iraniana podem ser contraproducentes e dificultar um desenlace
negociado. Ele também acerta ao
condenar a recente bravata de
Ahmadinejad, que alardeou a capacidade de produzir urânio
enriquecido ao nível de 80%,
próximo ao patamar necessário
para fazer a bomba.
Se realizado, tal procedimento
representaria uma clara violação
ao acordo internacional de não
proliferação de armas nucleares.
O modo como se desenvolverá
o embate entre Irã e países ocidentais é imprevisível. O Brasil
nada terá a ganhar ao se fazer representar, em maio próximo, no
lugar errado, na hora errada.
A política externa brasileira,
tradicionalmente conhecida por
sua discrição, equidistância e
passos seguros, tem sido marcada, em especial no segundo mandato do presidente Lula, por
comportamentos erráticos e decisões trêfegas. Servem como
exemplos o apoio incondicional,
em Honduras, ao presidente deposto Manuel Zelaya e, no caso
do Irã, ao governo de Ahmadinejad. O país saiu derrotado -e sua
imagem, prejudicada- no primeiro caso. Ainda há tempo para
reparar o erro, no segundo.
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