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FERNANDO GABEIRA
Um governo popular
A PESQUISA CNT/Sensus revelou como está alta a popularidade de Lula. Dezenas de
interpretações vão surgir. Gostaria
de acrescentar uma gota d'água a
esse oceano de tinta.
Muita gente enfatiza o crescimento econômico. Acha um absurdo que o Brasil cresça apenas mais
que o Haiti. E conclui, com isso,
que o governo está perdendo apoio.
Acreditamos demais no conceito
de PIB. Já na década de 70, ele era
criticado, porque não separava claramente as despesas das receitas.
O aumento do salário dos burocratas, por exemplo, era um crescimento do PIB.
Mais recentemente, com a emergência da consciência ecológica,
uma nova crítica se impõe ao PIB.
O crescimento econômico espetacular pode ser, ao mesmo tempo,
um fator de destruição das riquezas nacionais. A destruição das florestas acrescenta alguns dígitos ao
PIB, mas torna cada brasileiro
mais pobre.
Com suas imprecisões, o PIB não
ajuda a entender o processo. Se nos
voltamos para outra referência, a
distribuição de renda, vemos que
ela é a menos perversa dos últimos
30 anos. Isso não significa que os
problemas estão resolvidos. De um
ponto de vista popular, esta variável é bem mais importante que o
crescimento. O que não significa
que a distribuição seja sustentável
sem crescimento nem que a incapacidade de absorver novos trabalhadores tenha pouco reflexo nos
níveis de violência urbana.
Cada um articula como pode as
diferentes variáveis nacionais. A
distribuição de renda é um fator
decisivo nos governos de esquerda.
Um caso limite é o de Cuba. É uma
ilusão pensar que apenas a repressão política define a relativa adesão
dos cubanos a Fidel.
Restam outros fatores, como a
incompetência e a corrupção. No
caso da primeira, Lula é bastante
hábil para ficar de fora, exigindo
soluções rápidas, como se fosse um
opositor construtivo. No que diz
respeito à corrupção, ele se coloca
de novo de fora, sentindo-se traído.
Os observadores mais atentos,
digamos um quarto dos entrevistados, associam a crise aérea ao governo. E também identificam nos
métodos de montagem do gabinete
as sementes da corrupção.
No entanto, isso é apenas uma
parte do país, universo da classe
média, com seus editorialistas e
formadores de opinião.
Até que ponto é sustentável uma
rede social, sem crescimento?
Quando a violência urbana será associada ao ritmo do PIB, à corrupção, à incompetência?
Nenhum esquema de poder é
eterno. Mas este satisfaz à maioria
dos políticos. Eles adoram as benesses do governo. Resta a oposição, mas ela é pequena e, sinceramente, não leva jeito para o papel.
assessoria@gabeira.com.br
FERNANDO GABEIRA escreve aos sábados nesta
coluna.
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