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CARLOS HEITOR CONY
O que vai ser de nós?
RIO DE JANEIRO - Eu estava editando uma revista de atualidades. A
redação vazia ainda, o melhor fotógrafo da equipe senta à minha frente, cabeça baixa, olhos fundos, voz
arrastada: "O que vai ser de nós?".
Levei um susto. Tudo estava nos
eixos, boas vendas, nenhuma crise
ameaçando nossos empregos, nem
o dele nem o meu, que diabo, logo
de manhã, uma advertência daquelas. "Vai ser o que de nós?", perguntei, embora não alarmado.
A resposta veio sofrida: "Chagall
morreu... O que vai ser de nós?".
Bem, a coisa não era tão trágica assim. Por maior que fosse a minha
admiração por Chagall, acreditava
que o mundo continuaria o mesmo,
principalmente para mim. Pensando bem, até que melhor para a revista. Teria assunto para a capa e
para quatro nutridas páginas do número que começaria a fazer.
Pulando no tempo e no espaço.
Quando Stálin morreu, em 1953, a
turma do Kremlin se reuniu e decidiu não divulgar a notícia, temia
uma hecatombe. O povo acreditava
que, Stálin morto, o Sol não nasceria no dia seguinte. O que seria do
heroico homem comum que resistira a Napoleão e a Hitler, mas não
suportaria viver sem o Guia Genial
dos Povos, o "pápuska" de todos. O
mais sábio era esperar pelo dia seguinte, ver se o Sol nasceria mesmo.
Seguro morreu de velho.
Eu ia lembrando isso ao desconsolado repórter, a humanidade ficaria mais pobre sem o gênio de Chagall, mas o Sol já havia nascido lá para as bandas de Niterói, prosaicamente, como fazia todos os dias.
Não havia motivo para alarme.
É bem verdade que certas coisas
que acontecem no mundo volta e
meia me inquietam. Bem ou mal,
íamos levando a vida, até que o Obama descobriu que Lula é o cara. Antes, quando não sabíamos disso, tínhamos alguns problemas, mas dávamos a volta por cima. Agora, o
que vai ser de nós?
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